sábado, 22 de janeiro de 2011

UM CASO DE POBREZA - Recontando Contos Populares

Havia numa cidadezinha do interior, uma família que já fora possuidora de muita riqueza, mas que agora vivia na mais profunda miséria. A situação da família chegou a tal ponto, que seus sete membros compartilhavam o mesmo aposento, nunca tinham o suficiente para comer e suas roupas eram verdadeiros trapos. Não é de se admirar que eles vivessem na maior infelicidade, a reclamar pelos cantos o injusto destino. Seu Aristides, o chefe da casa, homem trabalhador, passava o dia todo e todo dia, a andar pela cidade atrás de um trabalho, mas o que aparecia eram apenas uns bicos aqui e ali. Vai daí, que ele ficou sabendo que numa casinha de pau-a-pique, já quase fora da cidade, morava Pai João, um “nego veio” muito sabido que, com bons conselhos, já ajudara muita gente a se aprumar na vida. Aristides, desesperançado, não deixou por menos, foi procurá-lo imediatamente.
— Seu João, a miséria de minha família é tão grande que mal conseguimos continuar vivos, nunca temos o suficiente para comer e estamos começando a odiar-nos uns aos outros. O que devo fazer?
Pai João, meditou por uns instantes e, simplesmente, respondeu:
— Você arruma um bode e "coloca ele" em sua casa por um mês. Então, “meu fio”, seus problemas serão resolvidos.
— Um bode? Viver com um bode? - Retruca Aristides, atônito.
Mas, pai João insiste.
E já que ele sabia das coisas, Aristides atendeu ao conselho.
Nos dias que se seguiram, a vida infernal daquela família foi além do tolerável. O bode comia tudo e o que via; não havia mais roupas porque o bode as comia também. A casa tornou-se uma verdadeira lixeira. Se já havia desavença dentro dela, agora se tornara explosiva. No final do mês, Aristides voltou à casa de pai João, doido da vida:
— Estamos vivendo há um mês com um bode dentro de nosso casebre. Tem sido horrível. Como pode ter dado um conselho, assim, tão ridículo?
 Seu João sacudiu lentamente a cabeça concordando, e diz:
— Agora se livre do bode e verá como suas vidas se tornarão calmas e tranquilas.
Nego veio tá certo! Quem acha que a vida tá ruim, coloque um bode nela, e vai ver o que é ruim, de fato. ®Sérgio.

O ESPELHO - Recontando Contos Populares

Conta-se que, lá pelos idos de antigamente, um vaqueiro resolveu fazer uma viagem até a cidade grande. Nas suas andanças por lá, viu em um bazar, pela primeira vez, um espelho - objeto até então desconhecido para ele. Quando olhou sua imagem refletida no espelho, julgou reconhecer ali o rosto do pai. Maravilhado com aquela magia, comprou o espelho.
Ao chegar a sua fazendinha, carregando na algibeira sua compra mais preciosa, foi ao celeiro e guardou-o num pequeno baú, onde também guardava sua vestimenta de vaqueiro. Sempre que se sentia triste e solitário, ia ao celeiro, abria o baú, e ficava contemplando o rosto do pai.
Sua mulher - que nada sabia do espelho - começou a notar que sempre que ele ia ao celeiro, saía com um aspecto diferente, isto é, com um "ar de felicidade". Desconfiada, começou a assuntá-lo. Por uma fresta na madeira, viu que o marido abria o baú e ficava longo tempo olhando para dentro dele.
Um dia, depois que o marido saiu para uma vaquejada, ela foi até o celeiro, abriu o baú e viu espantada, dentro dele, o rosto de uma mulher. Cheia de ciúme, esperou o marido chegar e pediu explicações sobre a mulher que ele guardava no baú. Mas o vaqueiro sustentava que era o seu pai que estava no baú. Armou-se então uma grande confusão familiar. Por sorte, uma beata tida como muito instruída e que não sabia mentir, ficou sabendo do caso e querendo esclarecer de vez a discussão, dirigiu-se a casa do vaqueiro. Lá chegando, foi logo pedindo que lhe mostrassem o baú. O vaqueiro e sua mulher a levaram até o celeiro e lhe mostraram o baú. A beata pediu-lhes que esperassem lá fora, enquanto veria o que havia no baú. Passado alguns minutos, ela grita de dentro do celeiro:
— Ora gente, vocês estão brigando em vão: nesse baú não há homem, nem mulher, mas somente uma beata como eu! ®Sérgio.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

O QUIASMO - Figuras de Linguagem

Quiasmo (de Grego, Khiasmós = disposto em cruz), que por seu turno, deriva da letra grega [X] qui. O quiasmo é uma espécie de antítese; também conhecido como antimetábole. Consiste no cruzamento de grupos sintáticos paralelos (dois ou quatro vocábulos), de forma que o grupo de vocábulos do primeiro se repete no segundo em ordem inversa (AB x BA):
Melhor é merecê-los [a] sem os ter [b]
Que possuí-los [b] sem os merecer. [a] (Os Lusíadas, c IX, 93)
Com dois elementos:
Desfeito em cinzas,
Em lágrimas desfeito.
O quiasmo também pode ser encontrado na prosa:
“De certos homens, dizia Sócrates, que não comiam para viver, mas só viviam para comer.(Pe. Antônio Vieira)
Risos que se umedeciam de lágrimas e lágrimas que se esmaltavam de risos.” (Antônio Patrício) ®Sérgio.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

O OXIMORO - Figuras de Linguagem

Oximoro (do Grego, oksúmoron = agudo, aguçado), é o paradoxismo, ou seja, o mesmo que o paradoxo, porque, aproxima também, termos ou expressões contrastantes e contraditórios num só pensamento, expressando uma verdade com aparência de mentira: Então, falo melhor quando emudeço...
Meu amargo prazer, doce tormento!
Era dor sim, mas uma dor deliciosa.  
O oximoro e o paradoxo são figuras bastante adequadas para manifestar ironia ou sarcasmo:
Nunca vi uma inteligência tão burra quanto a sua!
Essa é a sábia ignorância, a que Sócrates tanto se referia. ®Sérgio.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

O ABC DE CASTRO ALVES

"Pois assim foi Castro Alves. Há momentos no mundo em que todas as forças de uma nação se conjugam e, como uma nota mais alta que todas, aparece, tranquilo e terrível, demoniacamente belo, justo e verdadeiro, um gênio. Nasce dos desejos do povo, das necessidades do povo. Nunca morre, imortal como o povo.
Este cuja história vou te contar, foi amado e amou muitas mulheres. Vieram brancas, judias e mestiças, tímidas e afoitas, para os seus braços e para o seu leito. Para uma, no entanto, guardou ele suas melhores palavras, as mais doces, as mais ternas, as mais belas. Essa noiva tem um nome lindo, negra: Liberdade.
Vê no céu, ele brilha, e é a mais poderosa das estrelas. Mas o encontrarás também nas ruas de qualquer cidade, no quarto de qualquer casa. Seja onde for que haja jovens, corações pulsando pela humanidade, em qualquer desses corações encontrarás Castro Alves." (Jorge Amado) ®Sérgio.

sábado, 8 de janeiro de 2011

O JURAMENTO - Recontando Contos Populares

Conta-se que viviam em uma região do sertão dois compadres muito amigos, como se fossem irmãos. Um era fazendeiro, viúvo e muito rico; o outro, sitiante pobre e rodeado de filhos pequenos. Sua mulher era alta, magra e como todas as mulheres de sua condição seu traje habitual era uma blusa preta sobre um vestido qualquer, um lenço branco e engomado ao pescoço, outro na cabeça e um raminho de arruda atrás da orelha. No entanto, essa diferença financeira nunca afetou a amizade dos compadres.
Eis que, de repente o compadre pobre passou a ficar quieto, recolhido num canto virado bicho; emagreceu, definhou, inté dar a alma para Deus. Fosse o que fosse nada mais remediava. No velório, o compadre rico, agoniado, debulhado em lágrimas, acercou-se do caixão e, para que todos testemunhassem, disse ao compadre morto:
— Compadre! Aqui diante de sua mulher e de todos os seus filhos, eu quero fazer um juramento. Deste dia em diante, onde meus filhos estudarem, os seus filhos também vão estudar. Vou arrumar uma boa casa para sua família. Vou mandar todos os meses, por meio de um capataz, carne e alimentações gerais. Hei de respeitar sua memória, meu compadre. E ninguém há de proceder mal com sua mulher!
Pois não é que o compadre rico cumpriu religiosamente seu juramento, mesmo tendo ficado um bom tempo sem ver a família do falecido. Um belo dia resolveu fazer uma visita à comadre. Caminho longo de quatro léguas. Chegando a casa da comadre, qual não foi sua surpresa ao ser atendido por uma mulher alta, o corpo cheio de relevos, linda que só vendo. Linda de qualquer homem virar o tal do juízo.
Esta vida quando descansa de ser ruim, é até engraçada.
Penetrando na casa o compadre rico deu de cara com a foto do falecido; pensou: "Eu preciso de um particular urgente aqui com o compadre". Olhando para o retrato, disse:
 – Compadre! Quero sempre respeitar sua memória, por isso zelo para ninguém proceder mal com sua mulher! Mas, meu compadre, no dia que ela resolver proceder mal, que eu tenha a preferência.
Salve-se quem puder! ®Sérgio.

VIRANDO O ANO SEM SIMPATIAS

Nesta passagem do ano-velho para o ano-novo, resolvemos (a família) despojarmos-nos das tradicionais simpatias que costumávamos realizar em todas as outras passagens de ano.
Comecei abolindo a mania de usar roupa branca; francamente, toda noite de Ano-Novo, parecia que tínhamos, aqui em casa, reunião da Associação Médica ou de Enfermagem.
Foi um alívio não ter mais de guardar a rolha do champanhe estourado. Digo alívio porque no final do ano passado, foi o "ó do borogodó" achar o pedaço de cortiça, com todo o álcool na "cachola".
Manter as minúsculas sete sementes de romã e uma folha de louro no porta-moeda da carteira era um verdadeiro milagre.
O pior era pisar com o pé direito exatamente à meia-noite e dar três pulinhos com uma taça de champanhe na mão, sem derramar uma gota e depois, jogar todo o champanhe para trás, de uma vez só, sem olhar. Imagine todos pisando com o direito o tempo todo minutos antes da meia-noite, depois dando pulinhos e lavando o ambiente com champanhe. Dava a impressão de estarmos no hospício.
Salve-se quem puder!
É comum ouvir que nós, somos um povo muito supersticioso. Creio ser verdade. Entretanto, não sou uma pessoa supersticiosa, porque a pessoa supersticiosa possui apego infundado a qualquer coisa que lhe dizem, crê em fatos sem fundamento real. As simpatias que fazíamos, eram apenas formalidades, costumes passados de avós para netos, e assim, de geração a geração. É ou Noé? ®Sérgio.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

A ORIGEM DO ROMANCE FAUSTO

A história do Dr. Fausto - o sábio alemão que vende sua alma ao demônio Mefistófeles em troca de conhecimento e poder - não foi criação de Wolfgang Von Goethe (1749-1832).
Dr. Fausto é o único romance, cujo protagonista tem existência histórica real, que se tornou um mito literário. Magister Georgius Sabelius Faustus, como ele mesmo se apresentava, viveu na Alemanha entre o final do século XV e começo do século XVI. Dr. Fausto, além de médico, era estudioso das Ciências Ocultas; assumia publicamente a sua condição de feiticeiro. Ganhava o seu sustento praticando magia, fazendo horóscopos, vidências e produzindo fenômenos "sobrenaturais". De modo que, é possível que ele tenha realmente tentado alguma comunicação com o demônio, a fim de obter mais conhecimento sobre as Ciências Ocultas.
Na época, era crença popular de que os estudiosos dessa ciência, eram quase sempre signatários de pactos com o diabo. Portanto, se vivo já suspeitavam dele, quando morreu, de maneira violenta e causa misteriosa, virou lenda. E a lenda do Dr. Fausto e seu pacto com o demônio, espalhou-se rapidamente pela Alemanha e passou a fazer parte de sua cultura.
Em 1857, Johann Spiess, livreiro e escritor de Frankfurt, compilou tudo quanto se acreditava e dizia acerca do Dr. Fausto, em um livro de 227 páginas, conhecido por Romance Faustiano ou Faustbuch (O Livro de Fausto); cujo enredo contava como Fausto se vendeu ao diabo, as extraordinárias aventuras que viveu, a magia que praticava, e por fim a sua morte e castigo. Surgia a primeira narrativa literária sobre a lenda do Dr. Fausto. Pesquisadores afirmam que o texto tem um fundo moralista, ou seja, propaganda luterana para doutrinação.
Em 1589, dois anos depois da publicação de Spiess, o escritor e dramaturgo inglês (precursor de Shakespeare) Christopher Marlowe (1564-1593) transforma a primeira versão literária em peça teatral, com o título de A História Trágica do Doutor Fausto, que estreou com grande sucesso em 1594. A peça só foi publicada em 1604 (onze anos após a morte de Marlowe). Christopher Marlowe deu lustro estético à obra; resgatou a dignidade do personagem distinguindo-o do personagem histórico e da lenda popular; mas conservou a punição de Fausto, que na cena final desce ao inferno, porém em um clima muito mais trágico, de grande impacto junto ao público da época.
Coube a outro alemão, Wolfgang Von Goethe, em 1808, três séculos depois da morte do misterioso ocultista, salvar o atormentado sábio, com a versão intitulada Fausto. Drama em verso que consumiu 30 anos da vida de Wolfgang, de 1772 quando iniciou Urfaust (primeira versão) ao ano da publicação de Fausto. Foi a obra de sua vida. Goethe, em sua versão, não mantém a cena final tradicional; troca o trágico pelo dramático: Fausto em vez de ser punido no inferno é resgatado, na última hora, por anjos que enganam Mefistófeles e levam a alma do sábio para o céu.
Em 1943, Thomas Mann publica sua versão com o título de Doutor Fausto. É uma versão fora das raízes do mito. O personagem Fausto encarna um músico. O pacto dispensa os demônios, e o inferno vem na forma da sífilis que mata o protagonista.
O poeta português Fernando Pessoa deixou inconclusa a sua versão do mito, cujo título era Primeiro Fausto, a qual se dedicou durante boa parte da vida. Segundo o próprio poeta, a obra fala do embate entre a inteligência – representada por Fausto – e a vida.
Na música, o mito de Fausto foi tema de obras de Wagner, Schumann, Liszt Berlioz e Gounod.
"Fausto é um daqueles clássicos que, no caso de uma guerra dos mundos, seria preciso salvar para preservar o melhor da arte humana." (Federico Mengozzi, jornalista) ®Sérgio.
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Alguns dados sobre o Dr. Fausto foram extraídos e adaptados ao texto de: http://tv1.rtp.pt/antena2/index.php?article=672

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

APOLO E JACINTO: UM CASO DE AMOR

Apolo - deus do Sol, filho de Zeus e da ninfa Leto, irmão de Artemis (Diana) deusa da caça - apaixonou-se por um jovem mortal chamado Jacinto. É verdade! Como isso aconteceu? Bem... o que eu sei é que:
Jacinto era um jovem de rara beleza e muito apreciado pelos deuses do Olimpo. Segundo a lenda, ele nasceu em Esparta, fruto da união de Clio, uma das musas, e de um mortal. Além de belo, Jacinto também era musculoso e forte, predicados que chamaram a atenção de Apolo. Apaixonado pelo jovem, o seguia aonde quer que ele fosse.
Entretanto, Jacinto também era cortejado pelo poeta Tamiris e por Zéfiro (o vento oeste), que o conhecera antes do deus do Sol. Podiam, eles se colocaram contra Apolo? Tamires acreditava que sim. Então, para se livrar do poeta, Apolo diz às musas que ele se gabava de cantar melhor do que elas. As musas, iradas e vingativas, lhe retiraram a voz, a visão e a memória. Foi o fim de Tamires. Zéfiro, que muito bem conhecia os poderes de Apolo, permaneceu contrariado. Porém, um ódio surdo crescia em sua alma, despertando-lhe a vingança.
Aconteceu, pois, que num belo dia, quando os amantes se divertiam com um jogo - Jacinto se distinguia em todos os esportes –, Apolo lançou o disco de tal maneira, que Jacinto, entusiasmado com o lançamento, correu adiante para pegá-lo e ao mesmo tempo medir a distância percorrida pelo disco. Era a oportunidade que Zéfiro - amargurado pela preferência de Jacinto por Apolo - aguardava. O Vento Oeste, escondido em meio à folhagem de uma árvore, agarrou o disco em pleno voo, e lançou-o contra o crânio¹ de Jacinto, que caiu morto no mesmo instante. Apolo, cheio de profundo e íntimo desespero, correu até ele, levantou-o nos braços, mas a cabeça do jovem sem vida tombou sobre os ombros do deus do Sol. Eis a crueza medonha da morte. Eis o choque. Apolo era a própria imagem da tristeza infinita e do desespero inenarrável. O que era desejo se trocou subitamente em dor.
Sentindo-se o único culpado pela morte de Jacinto, Apolo jura que ele viverá para sempre na sua lira e como uma flor que renascerá em cada primavera. Dito e feito, no mesmo instante que o sangue de Jacinto chegou ao chão, se transformou numa flor do mais belo colorido; muito semelhante ao lírio, porém, roxa. Jacinto, a flor que renasce toda Primavera, relembrando o destino do jovem.
Afirmam estudiosos e pesquisadores, que a flor mitológica, não tem nada a ver com a flor do jacinto que conhecemos; a do mito, dizem, talvez se trate de alguma espécie de íris, de esporinha ou de amor-perfeito.
Wolfgang Amadeus Mozart compôs, em referência a esse mito, a ópera (em latim) Apollo et Hyacinthus seu Hyacinthi metamorphosis (Apolo e Jacinto ou metamorfose de Jacinto)  baseado no texto de R. Widl. Estreou em 13 de maio de 1767 na Aula Magna da Universidade de Salzburgo. ®Sérgio.
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1 – Em outra versão, Zéfiro não é responsável pela morte de Jacinto. Apolo atingiu-o sem querer.
Ajudaram na elaboração deste texto: Bulfinch, Thomas, O Livro de Ouro da Mitologia: Histórias de Deuses e Heróis, 26. Ed., Rio de Janeiro, 2002, Ediouro. / Gandon, Odile. Deuses e Heróis da Mitologia Grega e Latina. 1. São Paulo: Martins Fontes, 2000. / http://wikimediafoundation.org
Imagem: A Morte de Jacinto, 1801, óleo sobre tela de Jean Broc (1771-1850).

sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

OS AMANTES DE AFRODITE

Segundo a Teogonia de Hesíodo¹, Cronos (tempo), o mais jovem dos Titãs, filho de Gaia (Terra) e de Urano (Céu), nutria intenso ódio por seu pai. Um dia, quando Urano veio se estender sobre Gaia, Cronos saiu de seu esconderijo, e com uma foice de dentes agudos castra o pai e lança ao mar o membro cortado que ejacula uma última vez. Da espuma nasce Afrodite (Aphroditê = espuma do mar), a ciumenta deusa da beleza, do amor, do desejo e da sexualidade. Possuía um cinturão mágico de grande poder sedutor, cujos efeitos eram irresistíveis.
Casou-se com Hefesto (deus do fogo), coxo e um dos mais feios deuses do Olimpo. Porém, nunca se satisfez em ser a esposa caseira e, por isso não hesitava em arrumar amantes.
Com Hermes (mensageiro dos deuses) deu à luz a um menino que tinha os dois sexos; recebeu o nome de Hermafrodito. Eros (deus da paixão) e Anteros (deus da ordem) foi o que lhe deu Ares (deus da guerra). Seduziu Dionísio (deus do vinho) com o qual teve um filho chamado Priápo (deus da fertilidade). Este era tão promíscuo que os deuses proibiram sua entrada no Olimpo. Outro que não resistiu a magia de seu cinturão foi Apolo (deus do Sol), teve com ele o filho Himeneu (deus do casamento).
Entretanto, sua verdadeira paixão foi o jovem, belo e mortal Adônis; no entanto Afrodite teve de disputar a companhia do jovem com Perséfone. Afrodite pediu a ajuda de Zeus que se recusou a ser o juiz, passando o caso para um tribunal presidido pela musa Calíope que sentenciou: Afrodite e Perséfone teriam o mesmo direito sobre Adônis. Ele passaria um terço do ano com cada uma delas, e o terço restante poderia descansar das deusas insaciáveis. No entanto, Adônis, que preferia Afrodite, permanecia com ela os oito meses. Perséfone, ofendida, segredou a Ares que sua amante secreta iria trocá-lo por um vil mortal. Ares, sentindo-se ultrajado, tomou a forma de um javali e enquanto Adônis caçava, o matou com uma "chifrada" mortal. Afrodite teve com ele três filhos: dois mortais e um imortal.
 Outro caso famoso de Afrodite foi com o também mortal Anquises (príncipe troiano, primo do rei Príamo) com quem teve Enéias, herói da Guerra de Tróia.
As deusas Venus (romana), Freya (nórdica), Turan (etrusca), Ishtar (mesopotâmica), Inanna (suméria) e Astarte (mitologia babilônica), têm tudo a ver com Afrodite. ®Sérgio.
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1 - Há uma segunda versão sobre o nascimento de Afrodite: a de Homero. Entretanto, mais comum é a de Hesíodo.
Ajudaram na elaboração do texto: Bulfinch, Thomas, O Livro de Ouro da Mitologia: Histórias de Deuses e Heróis, 26º edição, Rio de Janeiro, 2002, Ediouro. / Gandon, Odile. Deuses e Heróis da Mitologia Grega e Latina. 1. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
Imagem: O Nascimento de Afrodite (detalhe), óleo sobre tela de William-Adolphe Bouguereau.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

IRONIA OU ANTÍFRASE - Figuras de Linguagem

A Ironia (figura de pensamento e palavra) consiste em dizer o contrário do que pensamos, mas dando a entender o tom irônico, geralmente, com a intenção de obter uma reação do leitor, ouvinte ou interlocutor, ou seja, pertubá-lo. A ironia estabelece um contraste entre o que se pensa e seu conteúdo. O elemento positivo (conteúdo) seve para demonstrar, realçar o valor negativo (aquilo que se pensa); maneira pela qual a ironia se assemelha a antífrase, a sátira e a hipocrisia:
Veja que belo serviço você fez!
Embora esta expressão contenha a ideia de que a pessoa fez um bonito serviço, a ideia de beleza é desmentida pela ênfase dada ao termo [belo], evidenciando que a intenção do falante é oposta aquela que está expressa na frase.
Você, realmente, é muito esperto.
Esta frase, aparentemente, não contém nenhuma ironia. Mas, dependendo da situação em que ela é utilizada, da entonação que se der às palavras, ela pode ser altamente irônica. Este é um aspecto bastante importante da ironia: o fato de ela não estar nas palavras em si, mas "por trás" das palavras.
Como a ironia está especialmente exposta ao perigo da incompreensão, precisa ser muito bem construída para não passar uma ideia completamente oposta à desejada, transformando-se em uma "ironia sarcástica"; isto é, uma ironia ofensiva, insultante. O sarcasmo é sempre um deboche altamente crítico:
"Olá! Tu que destróis o templo de Deus e o reedifica em três dias, livra-te a ti mesmo descendo da cruz". (São Marcos).
Exemplos de ironia na fala:
Você parece realmente um santinho digno do altar.
Seu café está ótimo: fraco, frio e sem açúcar.
Não é encantador o trânsito de São Paulo?
Muito competente aquele candidato! Construiu viadutos que ligam nenhum lugar a lugar nenhum.
Exemplos de ironia em Literatura
"... Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis..." (M. Assis)
"Moça linda bem tratada, / três séculos de família, /burra como uma porta: / um amor!" (M. de Andrade)
"A excelente dona Inácia era mestra na arte de judiar crianças." (Monteiro Lobato) ®Sérgio.

sábado, 18 de dezembro de 2010

CURRÍCULO VITAE OU CURRICULUM VITAE?

Currículo vitae não existe. Em Latim, é curriculum vitae (abreviado CV). Significa "a trajetória (carreira, curso, percurso) da vida". O plural é curricula vitae.
A menos que queira dar muita "ênfase" a sua carreira profissional, "prefira" a forma aportuguesada currículo / currículos, que é bem mais fácil que a forma latina. ®Sérgio.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

QUAL A LÓGICA DO ARTISTA?

Uma noite dessas conversava com um amigo e não tenho mais lembrança de como a caiu em uma pergunta: qual a lógica do artista?
Ora, pois, há muitos conceitos que responderiam a essa pergunta (você mesmo deve conhecer alguns), porém, um deles, escrito pelo poeta Ronald de Carvalho (1893 – 1935), me ficou na memória. Aqui vai tal qual:
"A arte é uma aspiração à liberdade. O que nós, poetas, músicos, pintores, escultores desejamos é criar o nosso ritmo pessoal, é transmitir a nossa harmonia interior. Cada um de nós é um instrumento por onde passa a corrente da vida. Não queremos regras nem admitimos preconceitos. Não nos atraem as teorias especiosas. A lógica do artista não cabe nas fronteiras de um teorema, a lógica do artista é um problema cujos dados mudam a cada instante, e cuja solução varia de momento a momento. Para empregar uma simples e admirável imagem de Nietzsche, dançamos acorrentados, dançamos sobre as coisas sem que a ela nos adaptemos, mas, ao contrário, tirando do espetáculo do mundo a substância da criação. A obra de arte não repete, mas advinha e transforma a natureza. O artista é um transfigurador. Recebe a energia da vida e, em troca, lhe dá forma.”
Antes que você me compare a Ezequias querendo queimar os livros de Salomão, vale dizer que o que leu é a reflexão de um poeta e, por isso, não posso, absolutamente, garantir que ele esteja certo, embora concorde com ele. ®Sérgio.
"Olha a vida primeiro, longamente, enternecidamente,
Como quem a quer adivinhar...
Olha a vida, rindo ou chorando, frente a frente,
Depois deixa o coração falar."
(Poeta Ronald de Carvalho, 1893 – 1935)

DOS PROPÓSITOS AOS REMORSOS...

"Tu não és o senhor de teu amanhã, não adies o momento de gozar o prazer possível. Consumimos nossa vida a esperar e morremos empenhados nessa espera do prazer." (Epicuro de Samos, filósofo grego)
Dos propósitos aos remorsos, dos erros aos desejos, nós mortais, arrastamos por toda parte, nosso manto de loucura e dor. Nas infelicidades passadas, nas mazelas presentes e nas esperanças futuras não vivemos nunca, esperamos a vida.
Amanhã, dizemos; amanhã estaremos melhores, realizar-se-ão todos os nossos desejos. O amanhã vem e nos deixa mais infelizes. E da noite que passa, esperamos, ainda, o que nos prometeram os nossos mais belos sonhos.
Amanhã são acasos da sorte!
É a vida no seu amargor,
Amanhã – o triunfo ou a morte;
Amanhã - o prazer ou a dor.
Hoje o dia nos cabe e nos toca,
De amanhã Deus somente é senhor!
                        (Gonçalves Dias, Amanhã)
O homem desperta e sai cada alvorada
Para o acaso das cousas... e, à saída,
Leva uma crença vaga, indefinida,
De achar o Ideal nalguma encruzilhada...
As horas morrem sobre as horas... Nada!
E ao Poente, o Homem, com a sombra recolhida
Volta, pensando: "Se o Ideal da Vida
Não veio hoje, virá noutra jornada..."
Ontem, hoje, amanhã, depois, e, assim,
Mais ele avança, mais distante é o fim,
Mais se afasta o horizonte pela esfera;
E a vida passa... efêmera e vazia:
Um adiamento eterno que se espera,
Numa eterna esperança que se adia.
(Raul de Leoni, Legenda dos Dias, in Luz Mediterrânea.) ®Sérgio.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

ACONTECEU MESMO

Este causo é tão certo como se passou. Eu o extraí do arquivo da Folha de São Paulo (publicado em 15 de agosto de 1994). Vou lhes contar com minhas palavras. Foi o seguinte:
Em 1990, era prefeito da cidade de Itambacuri (MG) – não me pergunte onde fica – o Sr. Ataliba Magalhães e o seu vice, o Sr. Kemel Ali Modad. A prefeitura, na pessoa de Ataliba, estava às voltas com uma série de reclamações dos agricultores do município sobre uma liberação de crédito do Banco do Brasil. Daí, então, para resolver a situação, o prefeito e seu vice decidiram ir a Brasília.
Na antessala do diretor da Carteira Agrícola, a secretária ofereceu-lhes um café, para amenizar a espera. Como a copeira resolvera tirar uma folga naquele dia, ela mesma foi buscá-lo. Voltou trazendo o bule e as xícaras, porém percebeu que havia se esquecido do açúcar, retornou à copa.
Na volta, viu que os visitantes já haviam tomado o café.
— Ah, doutor Ataliba, o senhor preferiu tomar sem açúcar. É, por acaso, diabético?
E Ataliba:
— Não, eu sou de Itambacuri.
Educada, a moça segurou o riso. Virou-se para o vice e repetiu a pergunta:
— E o senhor, é diabético.
E o vice:
— Não, eu também sou de Itambacuri. Sou o vice dele.
Diante da gargalhada incontida da jovem secretária, os dois se entreolharam sem entender nadinha de nada.
Salve-se quem puder! ®Sérgio.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

QUAL O MELHOR POETA? Cartas ao Leo

Pergunta-me quem foi o melhor poeta do Romantismo. Meu amigo, não espere de mim uma resposta. Pois, essa é uma questão profundamente estranha ao meu sentimento de poesia. Entretanto é a pergunta que sempre se faz quando se fala em poesia e poetas. Qual é o melhor poeta? É o que sempre ouço e, provavelmente, ouvirei enquanto viver neste mundo de Deus.
Para comprovar esse fato, basta você adentrar num fórum virtual de amantes dessa arte, para constatar que é o que mais interessa a um grande número de participantes. Não se contentam enquanto não se define o melhor, ou os melhores entre eles e em nossa literatura.
Entretanto, podemos perceber, com meio olho mesmo, que nada é mais difícil que a tarefa de se fazer comparações poéticas. Mesmo nos mais variados concursos poéticos virtuais em que se fornecem temas, se estabelecem prazos e se impõem condições aos concorrentes, o julgamento pode falhar, porque há uma quantidade de pequenas coisas, porém importantes no seu todo, que perfazem a obra de cada autor.
Imagine, agora, os obstáculos a enfrentar, quando se trata de comparar a produção inteira de vários poetas de nosso Romantismo, com estilos, temperamentos e de pensamentos diversos. A não ser, é claro, que haja uma diferença extraordinária, mas muito extraordinária mesmo, que por si só se estabeleça de um poeta sobre os demais.
Essa mania de comparações é algo que não consigo absorver. A mim, desde que um poeta me toque à alma e a faça vibrar, o que me importa saber, se ele é maior ou menor que qualquer outro? Por isso faço coro com Amadeu Amaral¹ quando diz: "Sorrindo, e chorando, e meditando, e aprendendo, e recordando, percorro os jardins maravilhosos da poesia, colhendo aqui e ali as flores que no momento mais me atraem, sem curar muito de saber quem foi o melhor jardineiro".
Contudo a mania ira permanecer. E a pergunta há de sempre se repetir: Quem é o melhor poeta? Eu de mim, meu caro amigo, não saberia dizê-lo.
Mas essas reflexões são minhas e não posso, absolutamente, lhe garantir que estou certo. Cabe a você julgar-me.
RSérgio.
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1 - A. Amaral (1875-1929): poeta, jornalista, filólogo, prosador, conferencista, está entre os legítimos valores da literatura brasileira contemporânea.

OS CHIFRES DE MOISÉS

Tenho em meu arquivo de imagens, a famosa escultura representando Moisés, esculpida por Michelangelo. Como meu hobby é o entalhe, não raro, estou a admirá-la, até mesmo para retirar detalhes anatômicos.
Sempre que a visualizava, intrigava-me o porquê de Michelangelo ter esculpido o Moisés ornado com dois corninhos, ou melhor, com dois chifres. 
Dias atrás, lendo um artigo de José Francisco Botelho, intitulado “Quem Escreveu a Bíblia?”, e vinculado à revista Super Interessante (dezembro de 08), descobri a verdadeira razão dos dois chifrinhos. Você já sabia? Maravilha!... Mas para quem não havia reparado, ou para quem nunca apreciou a obra de Michelangelo, ou ainda para quem desconhece o motivo, vou, com sua permissão, repassar, a meu modo, o que li e descobri.
Após a conversão do imperador Constantino o eixo do cristianismo se deslocou do Oriente Médio para Roma; porém para completar a romanização da fé, faltava traduzir o Antigo e Novo Testamento para o latim. Coube ao teólogo Eusebius Hyeronimus, que mais tarde viria a ser canonizado São Jerônimo, esta missão. Sob ordens do papa Damasco, ele viajou a Jerusalém para aprender hebraico e realizar a tradução, que duraram 17 anos.
Daí saiu a Vulgata, a Bíblia latina. Ela se tornou tão influente, mas tão influente, que até seus erros de tradução se tornaram clássicos. São Jerônimo, ao traduzir uma passagem do Êxodo que descreve o semblante do profeta Moisés escreveu em latim: cornuta esse fácies sua, isto é, sua face tinha chifres. Esse esquisito detalhe foi levado a sério por artistas como Michelangelo. Tudo porque Jerônimo tropeçou na palavra hebraica Karan, que pode significar tanto chifre quanto raios de luz. Portanto, a tradução correta seria: sua face tinha raios de luz e não chifres, ou melhor, tinha o rosto iluminado.
Aí está a resposta do que me intrigava: um erro na tradução bíblica levada a sério pelo mestre Michelangelo. Não seria este mais um caso da chamada fé cega? Afinal, Miguelangelo devia ter-se questionado, pois quem tem chifres é o demônio. É ou Noé? ®Sérgio.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

OS HINOS HOMÉRICOS - Estudos Literários

Atribui-se ao poeta Homero a coletânea de uma série de poemas - de diferentes autores (devido às diversidades entre os poemas), épocas e regiões da Grécia - dedicados a várias divindades. Daí o tradicional título de Hinos Homéricos. Chegaram até nós por meio de muitos manuscritos. Entretanto, nenhum deles contém todos os hinos e a maioria está em más condições.
Esses hinos eram compostos com o mais antigo tipo de metro: o hexâmetro.   O mesmo hexâmetro que formavam os versos da Ilíada, da Odisseia, dos poemas de Hesíodo e de outros poemas épicos. Apesar dos hinos apresentarem diferenças no número de versos, todos tinham a estrutura dividida em três partes:
Inuocatio (invocação) - apóstrofe ao deus homenageado.
Pars Epica (parte épica) - descrição dos atributos divinos, eventualmente acompanhada do relato de um ou mais episódios de seu mito.
Precatio (súplica) - contém uma saudação final, uma prece e, muitas vezes, uma referência a outro hino ou poema cantado no festival.
De acordo com o historiador grego Tucídides (460-400 a. C.), eles eram recitados pelos rapsodos (declamadores ambulantes, que iam de cidade em cidade propagando a Ilíada e a Odisseia) a título de introdução, prelúdio ou proêmio (canto introdutório) de solenidades religiosas ou de festivais religiosos. A finalidade era, logicamente, a de invocar a divindade solenizada ou enaltecida na ocasião.
Os hinos não possuem a mesma extensão e, no que tange a qualidade, são desiguais. O mais extenso deles é o dedicado a Hermes (580 versos); o mais curto a Demeter (três versos). Os mais importantes são, naturalmente, os mais longos: a Demeter, a Apolo, a Hermes e a Afrodite. Entretanto, entre os curtos, há hinos notáveis como: a Dionísio (quando capturado pelos piratas); a Pã (sobre as atividades nos campos e nos bosques); a Gaia, a Helio e a Selene.
De todos os hinos da antologia apenas dois tem autoria reconhecida: o do mais longo hino dedicado a Apolo (um rapsodo chamado Cineto de Quios) e a Ares (o filósofo neoplatônio Proclo). Os demais são anônimos.
A antologia é formada por 33 hinos para 22 divindades:
Afrodite
Apolo
Ares
Ártemis
Asclépio
Atena
Deméter
Dioniso
Dióscuros
Gaia
Hélio
Hefesto
Héracles
Hera
Hermes
Héstia
Musa
Réia
Posídon
Selene
Zeus
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®Sérgio.
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Informações foram retiradas e adaptadas ao texto de: RIBEIRO JR., W.A. Portal Graecia Antiqua, São Carlos. Disponível em www.greciantiga.org. / Bernabé Pajares, Alberto (ed.). Fragmentos de épica griega arcaica. Biblioteca Clássica Gredos, 20. Madrid: Gredos, 1999.