sábado, 2 de novembro de 2013

MALASARTE E AS JOIAS

Viajando sem destino fixo, errante, indiferente aos perigos, Malasarte foi dar na fazenda de um fazendeiro ricaço, que era casado e tinha uma filha. Precisando de uns vinténs, dormindo ao relento, à beira do caminho, Malasarte ofereceu-se para trabalhar na casa, e foi aceito pelo fazendeiro ricaço.
Como era tempo de chuva, o chiqueiro estava um lameiro que só vendo. Foi aí que Malasarte teve uma ideia.
Chegando a noite, campeou os porcos para longe e lhes cortou as caudas. Voltando ao chiqueiro, espetou no lameiro as caudas dos porcos.
De manhã, quando o dono da casa veio ver a porcada, Malasarte lhe apontou o lameiro e disse-lhe que os porcos estavam todos atolados, apenas com os rabos de fora. O fazendeiro, desesperado, mandou Malasarte ir correndo ao celeiro buscar duas enxadas para ver se conseguiriam desenterrar os porcos.
Pedro Malasarte foi à carreira; lá chegando, viu a dona e a filha colhendo laranjas no pomar e lhes disse:
— O patrão mandou as senhoras me acompanharem.
Elas duvidaram; então Malasarte gritou ao fazendeiro, perguntando:
— As duas, patrão?
— Sim, as duas, pateta! E sem demora! 
Então, as senhoras não querendo contrariar o fazendeiro, não puseram mais diferença e acompanharam Pedro que tomou, com elas, outra direção.
Bem longe da fazenda, Malasarte amarrou-as numa árvore, tirou-lhes todas as jóias que eram de grande preço, e fugiu com toda a porcada que tinha ocultado ali perto.
Quando o fazendeiro, cansado de esperar pelas enxadas, foi ao seleiro e não encontrou Malasarte, saiu a procurá-lo e acabou achando a mulher e a filha, amarradas a uma árvore e nada de Malasarte.
Quando o fazendeiro voltou ao chiqueiro com a enxada, descobriu que dos porcos só havia os rabinhos, e que ele é que era o verdadeiro pateta.
A muitas léguas dali, Malasarte negociou a porcada com outro fazendeiro. Com o dinheiro, comprou, no vilarejo, um bom jogo de roupas e caiu no mundo, muito do contente. ®Sérgio.

COMO MALASARTE COZINHA SEM FOGO

Aí vai uma história de Pedro Malasarte; história tão certa como ela se passou, que nem contada em letra de forma, ou pregada de púlpito, seria tão verdadeira.
Chegando, certa vez, Pedro Malasarte à cidade, logo se meteu em divertimentos e gastou todo o dinheiro. Mas antes que ficasse de todo limpo comprou uma panelinha de ferro, com três pés para apoiar sobre o fogo, uma matula e seguiu viagem.
Já era por umas onze da manhã, quando avistou um rancho desocupado. Apertado de fome, resolveu descansar ali. Fez fogo, pôs a panela de três pés com a matula a aquecer.
Mal acabara de aquecer a matula, vem chegando uns tropeiros. Pedro Malasarte mais que depressa pôs um monte de terra sobre o fogo, de modo que não ficou um graveto a vista, e ficou muito quieto diante da panelinha que fumegava.
Os tropeiros vendo aquilo ficaram muito espantados e perguntaram:
— Que moda é essa, caboclo, de cozinhar sem fogo?
Pedro respondeu logo:
— Isto não é para todos. Pois não vêem que minha panela é mágica?
— Então, ela cozinha sem fogo?
— É como estão vendo, e a qualquer hora. Mas como o médico me disse que estou por poucos dias e precisando de dinheiro para encomendar o corpo, posso negociá-la.
Os tropeiros viram na panela um verdadeiro achado; provaram da comida e acharam tudo muito bom.
Compraram a panela, pagando por ela o preço que Pedro Malasarte lhes pediu.
Vinha caindo à noite, quando os tropeiros foram cozinhar sem fogo e deram com a trapaça de Malasarte, que já tinha sumido nesse mundo de Deus.
Pois foi assim que aconteceu e já lá vão quarenta e cinco anos ou talvez cinqüenta, que nisto de contagem de anos não sou nenhum sábio da Grécia. ®Sérgio.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

ELA TEM ALGUMA COISA DE BOA ou DE BOM?

Embora os falantes de nossa língua tenham popularizado o termo "alguma coisa de boa", a gramática estabelece que o adjetivo que vem depois da preposição [de] não varia:
   Ela tem alguma coisa de bom (e nunca de boa).
   A moça ocultava alguma coisa de misterioso (e não de misteriosa).
Mas, atenção: Se, por acaso, não houver a preposição, faz-se a concordância normalmente:
   Ela tem alguma coisa boa.
   A moça ocultava alguma coisa misteriosa.
Observação: Seguem a mesma concordância: nenhuma coisa de, qualquer coisa de, algo de, nada de e tudo de:
   Ela tem tudo de bom.
   A moça não tem nada de misterioso. ®Sérgio.

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

FORMAS DE TEXTOS NARRATIVOS

Estes são os mais conhecidos tipos de textos narrativos:
Epopeia: longa narrativa em versos, que ressalta os feitos de um herói, ou envolvendo a história de um povo ou de uma nação. Três belos exemplos são Os Lusíadas, de Luís de Camões, Ilíada e Odisséia, de Homero.
Fábula - narrativa curta, geralmente confundida com o apólogo e a parábola. As personagens principais são animais irracionais com comportamentos semelhantes aos dos seres humanos, ou objetos. A finalidade é transmitir uma lição de moral implícita ou explícita. Escrita em versos até o século XVIII, em seguida adotou a prosa.
Romance: é um texto de caráter verossímil, longo, tanto na quantidade de acontecimentos narrados quanto no tempo em que se desenrola o enredo, com espaço e personagens bem definidos.
Novela: muitas vezes confundida em suas características com o Romance e com o Conto, é uma narrativa intermediária entre a longevidade do romance e a brevidade do conto. A narrativa acompanha a trajetória de apenas uma personagem. Como exemplos de novelas, podem ser citadas as obras O Alienista, de Machado de Assis, e A Metamorfose, de Kafka.
Conto: breve narrativa de ficção, geralmente em prosa, que conta situações rotineiras, anedotas e até folclores (conto popular). Caracteriza-se por reduzido número de personagens. Inicialmente, fazia parte da literatura oral e Boccaccio foi o primeiro a reproduzi-lo de forma escrita com a publicação de Decamerão.
Crônica: confundida com o conto. É uma narrativa breve, ligada à vida cotidiana, em linguagem coloquial e um toque de humor ou crítica.
Ensaio: texto literário breve, situado entre o poético e o didático, expondo um ponto de vista pessoal e subjetivo a respeito de certo tema humanístico, filosófico, político, social, cultural, moral, comportamental, literário, etc.. É menos formal e mais flexível que o tratado.
Parábola: diferencia-se da fábula por utilizar personagens humanas. A finalidade é também transmitir uma lição de moral implícita ou explícita.
Apólogo: é semelhante à fábula e à parábola, mas pode se utilizar as mais diversas personagens: animadas ou inanimadas, reais ou imaginárias, humanas ou não. Também transmite uma lição de moral.
Anedota: tipo de narrativa breve que tem o objetivo de provocar o riso. Utiliza-se, geralmente, da linguagem oral, mas pode ocorrer também em linguagem escrita.

Lenda: é uma história fictícia a respeito de personagens ou lugares reais. A lenda é mantida por meio da oralidade, até torna-se conhecida, quando, então, é registrada através da escrita. Normalmente fala de personagens conhecidas, santas ou revolucionárias. ®Sérgio.

O TEATRO SALTICO

Em Roma havia um estilo pantomímico denominado fábula saltica, com aspectos comuns com a pantomima grega. A fábula saltica tinha uma forma mais definida, podendo ser considerada como mais um predecessor do balé moderno e, essencialmente, uma forma de dança, geralmente séria e, algumas vezes, cômica, mas que contava histórias. Na maioria das vezes apresentava um ator-dançarino e, às vezes, um ator-assistente, com tramas tiradas usualmente da mitologia ou da própria História. A ação do dançarino silencioso era acompanhada por um coro que cantava um texto explicatório e uma orquestra composta de flautas, flautas de pã e címbalos.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

O MAR TENEBROSO

Por volta do século XV, o formato da Terra ainda não era um consenso entre os estudiosos da época. Muito a imaginavam plana como um disco, onde os mares terminariam em um abismo infinito. Se viajassem longe de mais encontrariam o fim do mundo e os barcos cairiam num abismo sem fundo.
Transmitida ou forjada pelos Árabes, a lenda do Mar Tenebroso descrevia um oceano Atlântico habitado por monstros terríveis que podiam afundar qualquer navio e mergulhado em uma escuridão constante, onde todos os navios naufragariam nas ondas medonhas ou nas águas ferventes.
Segundo - A.H. de Oliveira Marques. História de Portugal - "toda a classe de superstição afrouxava a curiosidade e refreava o desejo de presa. Durante muito tempo os Portugueses da Idade Média como os Europeus em geral, hesitaram entre a vontade de seguir além, para ocidente e para o sul, e o temor de não regressar mais. [...]."
Para o Sul, havia como que uma fronteira natural, o Cabo Bojador. A muitos quilômetros de distância do Cabo ouvia-se o rugido das vagas altas que batiam contra os penhascos; a costa era perigosa. Havia nevoeiros espessos... Os marinheiros pensavam que chegavam ao Mar Tenebroso e ao fim do mundo e quando avistavam o longo promontório do Cabo, penetrando com profundidade pelo mar, ficavam convencidos que ali era o limite, a barreira, o fim do mundo, o abismo. ®Sérgio.

sábado, 5 de outubro de 2013

A LENDA DO CUPIM

As lendas indígenas são lendas interessantes, geralmente de fundo histórico; algumas vezes reminiscências, restos de fatos verídicos, conservados parcialmente pela tradição histórica.
O conselho indígena obrigou uma formosa jovem a se casar com um rapaz, contra a sua vontade. Ela não gostava do marido de jeito nenhum. À noite, quando ele vinha se deitar, tentando abraçá-la, ela descia da rede e ficava de costas. Toda noite era assim. Para ver se aos poucos ela se acostumava, o pai convidou o genro para caçarem no mato, levando-a junto. Mas ela continuava a não querer dormir com o marido. O pai teve uma ideia. Pegou muitos vaga-lumes (bagapbagawa man, na língua indígena). Então, sem que a filha percebesse, pregou os de vaga-lumes nos cupins (txapô). Fez isso de dia. Atou a rede da filha bem pertinho do ninho de cupim (munduru), e a rede do marido do outro lado. Assim, fez uma cabana (tapiri) entre as duas redes.
Anoiteceu, jantaram, e a moça deitou na própria rede. Dormiu. Quando foi no meio da noite, acordou e viu aquele munduru alumiado. Assustou que só vendo e deitou com o marido. Nunca mais o largou, e até hoje é possível ver a luz do munduru. ®Sérgio.

NOÉ E A CRIAÇÃO DO VINHO

Esta é a lenda Armênia de Noé e da Criação do Vinho, contada Hovanés Tumanian, um dos maiores poetas de todos os tempos na Armênia. Fiz pequenas adaptações, por julgá-las necessárias.
Após quarenta dias e quarenta noites de chuvas torrenciais, a Arca de Noé se deteve na mais alta montanha da Armênia: o Monte Ararat, ponto de partida de um novo mundo perdoado e purificado.
O primeiro trabalho de Noé, ao sair da Arca, foi plantar a vinha para criar o Vinho, pois, cansado estava de ver tanta água durante o dilúvio.
 Ao começar a plantar as primeiras ramas da vinha, o diabo aparece e diz:
– O que está fazendo aí?
– Estou plantando uma vinha.
– Para que?
– Seu fruto é doce e gostoso. Quando espremido dá um suco que reconforta o coração do Homem.
– Quero te ajudar, diz o diabo.
– Como quiser, responde Noé.
Plantada a vinha, o diabo vai buscar na arca, um cordeiro, um leão, um macaco e um porco. Degola-os e rega a planta com o sangue deles.
É por isso que quando alguém bebe vinho, fica primeiro dócil tal qual cordeiro, depois se sente forte como leão, a seguir começa a fazer caretas, feito macaco e, por fim, quando bêbado, torna-se um porco. ®Sérgio.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

MEIA NOITE OU ZERO HORA?

A meia-noite e a zero hora se equivalem, mas a primeira pertence ao dia anterior e a segunda, ao posterior.
Assim, um aumento, por exemplo, entra em vigor à meia-noite da sexta-feira ou à zero hora do sábado (prefira zero hora, neste caso).
A madrugada vai da zero às 6 horas; a manhã, das 6 ao meio-dia; a tarde, do meio-dia às 18 e a noite, das 18 às 24 hor
as. ®Sérgio.

A PEDRA DE DIAMANTE - Contos Populares

Já faz muito tempo, numa roda de boteco, nego João, velhaco como ele só, se gabava de que fazia somente aquilo que queria. Vai daí que um dos formavam a roda, querendo desmascarar a gabolice de João disse-lhe assim:
— Já que você é tão esperto, quero ver se é capaz de ir à casa do Dr. Glacindo e almoçar com ele na mesa. Se conseguir fazer isso, ganhará dez mil réis como prêmio pela esperteza.
Esse Dr. Glacindo era um sujeito bonachão, orgulhoso, muito cheio de si, e muito rico. Não tirava o chapéu a ninguém. Tratava a todos com pouco caso.
Nego João tomou um gole de cachaça, guspiu grosso, limpou os beiços com as costas da mão e respondeu:
— Eh! Nego João vai almoçá na mesa cum seu doutô. Num prometo o que num cumpro. Tô com esses mil réis na mão. Vou mostra a vancês tudo cumo se ganha dinheiro à toa...
No dia seguinte, justamente na hora do almoço de seu doutor, João foi rondar a casa e, quando viu que “seu” doutor já estava na mesa com a família e com dois manda-chuvas do lugar, bateu na porta com força. E, quando veio o criado abrir foi entrando muito tal e qual, com ar de importância, como se ninguém pudesse com ele.
Enveredou pela sala de jantar, encarou o doutor que olhava para ele carrancudo e espantado, e disse-lhe assim, baixinho, com jeito de quem pergunta:
— Eh, doutô, uma pedra de diamante deste tamanho quanto é que vale? E apontou para o bolso onde, supostamente, tinha a dita pedra do tamanho de um limão.
O doutor pensando que de verdade nego João havia encontrado algum diamante tão grande, não querendo revelar o segredo às outras pessoas daquele achado, mudou de conversa:
— Então João, você como vai? Já almoçou? Senta. Mariquinha traga prato e talher para o João.
O malandro do João que estava todo elegante, no terno branco que emprestou de um amigo, sentou-se à mesa e pôs-se a comer limpando o prato.
O doutor fez com que o almoço acabasse depressa tão aflito estava para ver a tal pedra de diamante.
Não demorou muito, levantaram-se todos da mesa e o doutor carregou João para o escritório e lhe perguntou, muito baixinho:
— Então, meu nego, que é da pedra?
— Pedra, que pedra...
— A pedra de diamante...
— Nego João não tem pedra de diamante nenhuma... Quem sou eu para possuí pedra de diamante!...
— Pois você, nego do diabo, não disse que achou um diamante?...
— Ieu!...
— Então, patife, porque é que perguntou quanto vale uma pedra de diamante deste tamanho?...
— Eh, doutô, ieu queria sabê que é pra quando ieu achá, ozoutros não mi lográ no preço...
O doutor, bufando de raiva, correu com ele pela porta fora. E nego João foi ao encontro do pessoal que o esperavam no boteco. O apostador lhe pagou os dez mil réis e depois fizeram uma grande bebedeira. ®Sérgio.

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

A ESCRITA CONTÍNUA

O ritmo de vida das pessoas mudou muito. E sua relação com a escrita, na Internet, foi na mesma direção. Palavras são abreviadas e, não raro, descaracterizadas, para acompanhar a velocidade de comunicação da Internet. Evidentemente, falo das conversas instantâneas no Messenger e similares. O interessante é que esse modismo tem atingido a muitos escrevedores textuais, seja por condicionamento, seja por opção.
A pontuação, por exemplo, é quase que ignorada porque leva o cérebro a fazer uma pausa mental, o que acaba por alongar a digitação e a leitura. Na verdade a pontuação em um texto, não é uma questão de tempo, mas sim, de certos preceitos lógicos e sintáticos. De maneira que existem orientações e normas a serem seguidas.
Veja você, a confusão que a ausência de uma vírgula, em um trecho bíblico, tem causado entre algumas religiões.
No Evangelho de São Lucas, capítulo 23, entre os versículos 39 e 43, narra-se a passagem em que Cristo é crucificado entre dois ladrões, passagem conhecida como do “bom ladrão”. No versículo 43 temos a fala de Cristo em resposta ao bom ladrão:
(42) E acrescentou: “Jesus, lembre-te de mim, quando vieres com teu reino”. (43) Ele respondeu: “Em verdade, eu te digo, hoje estarás comigo no paraíso”. (A Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulinas. Mateus: 23. 39-43.)
A pontuação utilizada na fala de Cristo não é de consenso entre as religiões cristãs. Há algumas que - apoiadas nos textos de outras versões bíblicas - alegam que a entrada no paraíso não se dá no dia da morte, mas no momento em que Cristo retornar a terra, ou seja, na sua segunda vinda. Para esses cristãos a fala ao bom ladrão deve ser:
Ele respondeu: “Em verdade, eu te digo hoje, estarás comigo no paraíso”.
Perceberam como o deslocamento da vírgula interferiu no sentido da frase?
Pois é, a interferência está relacionada ao advérbio "hoje" e a vírgula.
Na primeira versão – eu te digo, hoje estarás [...]. - hoje é o tempo em que o bom ladrão estará com Cristo no Paraíso: o mesmo dia de sua morte. Na segunda versão – eu te digo hoje, estarás [...]. - indica que hoje é o tempo do dizer, não da entrada no paraíso.
Quem está certo?!
Aí está a conseqüência da não pontuação em um texto. Como a versão original da bíblia está redigida em escrita contínua – Em verdade eu te digo hoje estarás no paraíso - sem pontuação, cria-se a ambigüidade. Assim, podemos dizer, com razão, que ambas as interpretações são válidas. Você pode escolher a que mais lhe convém. ®Sérgio.

TEMPORAL

Seleta de Poemas representa as poesias que li e tocaram-me a alma. Assim, posso compartilhar com vocês as minhas preferências poéticas, ou homenagear autores que admiro.
TEMPORAL
Quem viu a terra gemer
Nos dentes brancos do mar
E a laje fria da espuma
A sete palmos do olhar
Pisou as curvas do mapa
E os raios do sol nascente
Tocou as cordas da harpa
De aço incandescente
Eu percorri todo o sonho
No meio da madrugada
E vi plantações de balas
Sementes da espingarda
Eu mato, matas e mata
Quem fala, não mata não
Quem cala, consente a fala
E os gritos do capitão
Quem viu os cachorros negros
Latindo para o luar
E o vôo vão dos morcegos
Gritando mudos no ar
Conhece a força guardada
Na mola dos temporais
Escurecendo as estrelas
Nos ombros dos generais
A mais cruel armadilha
Encruzilhada dos fins
E os alicerces das ilhas
Roídos pelos cupins
A fina dor da ferida
Doendo até no facão
E o mapa da minha vida
Na palma da minha mão
Quem viu o braço da sombra
Das folhas de uma palmeira
Pousar em carícia longa
Nos ombros da terra inteira
Ouviu da boca da noite
Feroz silêncio mortal
E viu o bobo da corte
Dançando no funeral.
Helder Meirelles poeta nordestino

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

UM CASO DE HIGIENE

Você acreditaria que o papel higiênico quando foi inventado encontrou resistência para ser aceito? É um detalhe sórdido, porém verdadeiro. Pois a higiene pessoal, tal como a concebemos hoje, só começou a se estabelecer no século XIX, antes disso, as pessoas não só toleravam a sujeira como também, muitas vezes, nutriam certo deleite pessoal com ela.
Pesquisadores famosos contam que praticamente todas as civilizações da Antiguidade deram grande valor à higiene pessoal e ao bem-estar físico. No entanto, alguns fizeram uma constatação chocante e polêmica: o cristianismo representou um retrocesso na história da higiene. Será?
Eles argumentam que na Antiguidade os egípcios já fabricavam sabão; na Grécia o banho era uma instituição cotidiana. Os romanos criaram aquedutos para abastecer suas principais cidades e frequentavam diariamente banhos públicos, onde o corpo era lavado e esfregado vigorosamente (não se usava sabão) para tirar a sujeira. Mas, que tudo isso desapareceu com a queda do império e a ascensão dos cristãos. É claro que o banho não desapareceu, assim, da noite para o dia. Porém, aos poucos, esses locais de banhos, foram associados a costumes pagãos e, consequentemente, ao pecado. Neste caso, vários registros históricos comprovam o fato. Por exemplo, no século VI era regra da vida monástica a determinação de São Bento de que só os monges doentes ou muitos velhos fossem autorizados a se banhar. Na maioria dos monastérios da Europa medieval o banho era praticado três vezes, no máximo, ao ano. E como a Igreja tinha grande influência entre a população que vivia fora do claustro, supõe-se que o costume não fosse muito superior a esses três dias.
Por muitos séculos a higiene pessoal do cristão europeu não passou de lavar as mãos antes das refeições e esfregar seus dentes com paninhos, até que a           prática de lavar o corpo todo, retorna-se ao seu cotidiano.
Anotei alguns fatos que comprovam esse enunciado. Veja:
No palácio de Versalhes, um decreto de 1715, estipulava que as fezes seriam retiradas dos corredores uma vez por semana. Ora bem, se decretaram uma vez por semana; eu suponho que o recolhimento antes do decreto demorava muito mais.
Atribuíam-se perigos ao banho: lavar o corpo todo abriria os poros facilitando a infiltração de doenças. Além disso, acreditava-se que a roupa absorvia a sujeira do corpo. Portanto, era só trocar de roupa todos os dias para manter-se limpinho. No entanto, Dom João VI, não acreditava muito nesse conceito. Ele detestava banho e costumava a vestir a mesma roupa até que apodrecesse.
Relatos de palacianos contam que a rainha espanhola Isabel (1451 – 1504) só tomou, em toda a sua vida, dois banhos de corpo inteiro.
Hoje a higiene pessoal parece ter chegado a extremos, especialmente entre os americanos. Alguns cientistas já alertaram que essa superproteção higiênica está debilitando a resistência imunológica das crianças e aumentando a incidência de doenças.
Pois bem, mas... e o papel higiênico? Ainda, segundo os historiadores, o papel higiênico só surgiu nos Estados Unidos, em 1857; e o produto demorou a vencer a resistência do mercado pela palha de milho, pela esponja, entre outros. Certo mesmo é que antes do papel higiênico, cada um se virava como podia. ®Sérgio.

IMPRESSO OU IMPRIMIDO?

Os dois termos são de uso corrente em nossa língua. Porém, não devemos usá-los de maneira aleatória.
O verbo [imprimir] apresenta mais de uma forma para a flexão do particípio (verbos abundantes). Com o significado de [publicar], de [impressão gráfica], ele possui duas formas de particípio: a regular e a irregular. Portanto:
1. Impresso (pertence à forma irregular) - use com os verbos [ser e estar]: foi impresso o edital de convocação.
   Os convites já estão impressos.
   Os cartazes ainda não foram impressos.
2. Imprimido (pertence à forma regular) – use com os verbos [ter e haver]: Esta gráfica tem imprimido muitos jornais.
   A gráfica não havia imprimido as notas.
   Os alunos tinham imprimido o jornal sem nenhuma ajuda.
Observação: As formas regulares estão caindo em desuso, em virtude da preferência pela forma mais curta: impresso em vez de imprimido. Muitos estudiosos já aceitam as formas irregulares até com os verbos [ter e haver].
3. O Verbo Imprimir, no sentido de [produzir movimento], não é abundante, isto é, só tem o particípio em [–ido]. Portanto, pode ser usado com qualquer auxiliar:
   O motorista havia imprimido grande velocidade ao veículo.
   Foi imprimida grande velocidade ao veículo.
   A gráfica tem imprimido pouca velocidade à impressão.
   Tenho imprimido alta velocidade a meu carro. ®Sérgio.

CONSIGO ou COM VOCÊ?

Consigo é um pronome reflexivo – significa com si mesmo - ou seja, é aplicado quando o sujeito e o objeto da oração são a mesma pessoa. Quando tratamos as pessoas em 3ª pessoa (você, Vossa Senhoria, Vossa Excelência, senhor, doutor, etc.) não devemos usar consigo, e sim, com você.
Portanto, é errado o uso de "consigo" como equivalente de "com você" em frases como:
   Querem falar consigo. Nesta frase, se afirma que eles querem falar com eles próprios.
   O pessoal está magoado consigo. Aqui, o pessoal está magoado com eles próprios.
As formas corretas são:
   Querem falar com você. (com o senhor, com Vossa Senhoria, etc.)
   O pessoal está magoado com você.  Ele vai sair com você.
   Ele irá entender-se com o senhor.
Consigo só deve ser utilizado com o sentido reflexivo:
   Ele fala consigo mesmo. Ele trouxe as mercadorias consigo.
   Os homens carregam consigo as suas penas.
   Vive lá consigo, sem ninguém que dele cuide.
É comum o uso das palavras próprio (a), mesmo (a) juntamente com consigo para reforçar a ideia reflexiva.
Contigo só deve ser usado quando tratamos as pessoas em 2ª pessoa (tu, teu, tua, te, ti, etc), ou seja, o pronome do caso oblíquo "contigo" refere-se ao pronome [tu]:
   Ele te disse isso, porque deseja viajar contigo. (com + ti, tu)
   Espera que ele já vem falar contigo. (com + ti, tu) ®Sérgio.

SEM PALAVRAS


sexta-feira, 9 de agosto de 2013

ESMERALDA - Seleta de Poemas

Seleta de Poemas representa as poesias que li e me emocionaram. Por isso, não quero que esses versos fiquem esquecidos. Estou certo de que pelo menos um leitor[a], amigo[a] da poesia, me há de agradecer a lembrança.
Esmeralda
Esmeralda, onde estão teus noivos?
Teus irmãos, teus primos, onde estão?
Onde está teu velho Amor, teu namorado,
Aquele de antigamente, que vagava nas ruas?
Onde estão teus sonhos, Esmeralda?
Augusto Frederico Schmidt (1906 – 1965)

TERESA - Seleta de Poemas

Seleta de Poemas representa as poesias que li e me emocionaram ou me agradaram no conteúdo. Assim, posso compartilhar com vocês as minhas preferências poéticas e homenagear os autores que admiro.
TERESA
Teresa, se algum sujeito bancar o sentimental em cima de você
E te jurar uma paixão do tamanho de um bonde
Se ele chorar
Se ele ajoelhar
Se ele se rasgar todo
Não acredita não Teresa
É lágrima de cinema
É tapeação
Mentira
CAI FORA.
        • Manuel Bandeira (1886–1968) poeta, crítico literário e de arte, e professor de literatura. ®Sérgio.

quarta-feira, 31 de julho de 2013

A LENDA DO HOMEM CHUVA

Begorotire era um índio cabelos negros e muito forte. Certo dia, porém, na divisão da caça, foi "passado para trás". Injustiçado ficou furioso e, por causa disso, decidiu que sairia à procura de outro lugar para viver. Pintou toda a família com uma tintura preta que havia retirado do fruto do jenipapo. Pegou um pedaço de madeira pesada e resistente, da qual fez uma borduna Caiapó (grupo indígena habitante da Amazônia brasileira), com o cabo trançado em preto e a ponta tingida com sangue da caça. Chegou então ao alto de uma montanha, levando sua borduna, e começou a gritar. Seus gritos soaram como fortes trovões. Girou fortemente sua arma no ar e de suas pontas saíram relâmpagos. Em meio ao barulho e às luzes, Begorotire, com os olhos alumiados, subiu aos céus. Os índios assustados atiraram suas flechas, mas não conseguiram impedir que Begorotire desaparecesse no firmamento.
As nuvens, também assustadas, derramaram chuva que parecia que o mundo vinha abaixo. Por isso Begorotire tornou-se o homem chuva. Tempos depois, levou toda a família para o céu, onde nada lhes faltava, e de lá muito fez para ajudar os que na terra ficaram. Juntou sementes de suas fartas roças, secou-as sobre o girau e entregou a uma de filhas para trazê-las a terra.
A pequena índia desceu dentro de uma cabaça enorme amarrada a uma longa corda, tecida com as próprias ramas do vegetal. Caminhando pela floresta, um jovem encontrou a cabaça, amarrou-a com os cipós e pedaços de madeira e, com ajuda dos amigos levou-a para a aldeia. A mãe, abrindo a cabaça, encontrou a índia, a filha da chuva, que estava magra e com longos cabelos, por lá haver permanecido muito tempo.
A jovem foi retirada e alimentada, e teve seus cabelos aparados. Ao ser indagada, a filha da chuva explicou por que viera, entregando-lhes as sementes enviadas por seu pai e deixando a todos muito felizes. O jovem que encontrou a cabaça casou-se com a moça, passando esta a morar novamente na terra. Com o tempo, resolveu visitar os pais. Pediu ao esposo vergasse um pé de Pindaíba, trazendo a copa até o chão. Sentou-se sobre ela e, ao soltarem a árvore, a índia foi lançada ao céu. Ao retornar, trouxe consigo toda a família e cestos repletos de bananas e outros frutos silvestres. Begorotire ensinou a todos como cultivar as sementes e cuidar das roças, regressando depois ao seu novo lar. Ate hoje, quando as plantas necessitam de água, o homem chuva provoca trovões, fazendo-a cair sobre as roças para mantê-las sempre verdes e fartas. ®Sérgio.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

O SONETO DO SEU GREGÓRIO

A capacidade, a habilidade e o ardil satírico de Gregório de Matos, deixam- me, sobremaneira, desconcertado. Com que facilidade, esse artífice do verso, trabalhava seus poemas. Veja:
De acordo com fontes históricas, certa vez, um conde pediu a Gregório de Matos que fizesse um soneto em seu louvor. O poeta, porém, não achou nele nada que pudesse ser enaltecido. Não querendo desagradar o nobre conde, compôs assim mesmo o soneto que vai abaixo:

   Um soneto começo em vosso gabo¹              (¹ louvor)
Contemos essa regra por primeiro,
Já lá vão duas, e esta é a terceira,
Já este quartetinho está no cabo²                  (² no fim)
Na quinta torce agora a porca o rabo:
A sexta vá também desta maneira,
Na sexta entro já com a grã³ canseira           (³ grande)
E saio dos quartetos muito brabo.
Agora nos tercetos que direi?
Direi que vós senhor, a mim me honrais,
Gabando-vos a vós, e eu fico um Rei.
Nesta vida um soneto já ditei,
Se desta agora escapo, nunca mais;
Louvado seja Deus, que o acabei.
Com que maestria Gregório compôs este soneto. O poeta obedecendo à estrutura do soneto e a ela referindo-se com palavras bebidas aqui e ali, ele esvaziou o conteúdo e não se comprometeu em falsos elogios. É por coisas assim que tenho de admirar a qualidade saborosa desse poeta. ®Sérgio.