sexta-feira, 29 de julho de 2011

AGOSTO MÊS DO DESGOSTO

Aqui, mal começa agosto o Sol já aparece amarelo e fosco, num mormaço sufocante. Logo vem as "fumaradas", deixando o ar parado e denso, num calor de febre. Pois é agosto, como diz o provérbio, mês do desgosto.
Deixando escapar, por agora, essa questão do clima, descobri que a expressão - "agosto mês de desgosto" - não é nossa, herdamos dos nossos colonizadores portugueses.
No século XVI - época das grandes navegações - as caravelas portuguesas iam ao mar no mês de agosto. De modo que, as namoradas dos navegadores nunca casavam nesse mês. Primeiro, porque não poderiam desfrutar da lua de mel; e, segundo, porque poderiam passar rapidamente da condição de recém-casadas para a de viúvas.
Segundo o escritor português Mário Souto Maior, ficou, então, consagrada essa tradição com a frase: "casar em agosto traz desgosto". Ora bem, quando ela (a frase) chegou aqui, fizemos o que mais gostamos de fazer com nomes e expressões: abreviar, reduzir.  E, assim, agosto virou "mês do desgosto".
Mais ainda, a má fama do agosto agourento, já existia bem antes das grandes navegações portuguesas. Os romanos, no século I, acreditavam que um dragão passeava pelo céu noturno em agosto (mês batizado em homenagem ao imperador Augusto). O monstro nada mais era do que a constelação de Leão, mais visível nessa época do ano.
Pois aí está, agosto do desgosto veio de lá, mas agosto "fumarado" é mais que nosso. É ou Noé? ®Sérgio.

domingo, 24 de julho de 2011

SANGUE LIMPO

— Sou filho de um escravo, e que tem isso? Onde está a mancha indelével?… O Brasil é uma terra de cativeiro. Sim todos aqui são escravos. O negro que trabalha seminu, cantando aos raios do sol; o índio que por um miserável salário é empregado na feitura de estradas e capelas; o selvagem, que, fugindo a colonização, vaga de mata em mata; o pardo a quem apenas se reconhece o direito de viver esquecido; o branco, enfim, o branco, que sofre de má cara a insolência dos mais ricos e o desdém do governo. Oh! Quando caírem todas essas cadeias, quando esses cativos todos se resgatarem, há de ser um belo e glorioso dia! (Ato II, cena 12, da peça Sangue Limpo de Paulo Eiró¹)
Sangue Limpo é um drama que tem por cenário São Paulo nos dias da Independência e situa um caso de amor entre um jovem da burguesia e uma jovem parda. O preconceito é vencido pelo rapaz que se rebela contra o pai, ao mesmo tempo em que este é assassinado por Rafael, um negro que jurara nunca mais "ajoelhar-se aos pés de um senhor".
   Na cena 12 do ato II, temos a fala em que Rafael, irmão da jovem mestiça, responde ao "Senhor" que lhe perguntara se corria sangue escravo em suas veias. ®Sérgio.
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1 - Paulo Eiró (1836-1871), foi poeta e dramaturgo.

sábado, 16 de julho de 2011

AS REGÊNCIAS DO VERBO AGRADECER

Nós aprendemos a regência naturalmente, intuitivamente, no dia-a-dia. Ninguém precisou ensinar para nós que quem gosta, gosta de alguém. Ou que quem concorda, concorda com alguma coisa. Ou que quem confia, confia em algo. E assim por diante. Só que a gramática, muitas vezes, estabelece formas diferentes das que utilizamos na linguagem cotidiana, como as que veremos abaixo:
1ª. Com o sentido de mostrar-se grato por alguma coisa, é transitivo direto. Use-o sem preposição:
   Agradeceu o favor recebido.
   Agradeço o favor que me prestou.
   Agradeço a audiência recebida.
   Agradeço as flores que me enviou.
   Agradecemos o bom atendimento.
2ª. Com sentido de demonstrar gratidão a alguém, é transitivo indireto. Use-o com a preposição [a]:
   Agradeço aos ouvintes.
   Já agradeci aos que me ajudaram.
   Recebi o livro e ainda não lhe agradeci. (lhe = a você)
   A empresa agradece aos funcionários.
3ª. Com o sentido de demonstrar gratidão "a alguém" por "alguma coisa", é transitivo direto e indireto:
   Agradecemos a V.S.ª (indireto) / o convite (direto).
   Agradecemos ao Senhor (indireto) / as bênçãos (direto) recebidas.
   Agradeço ao chefe / a carta de recomendação.
   Agradeceu-lhe (= a ele) o convite.
   Agradeceu-lhes (= a eles) a gentileza.
   Agradeceu a Deus (indireto) a graça alcançada (direto).
Observação: Como se agradece sempre a alguém, não existe a forma "agradecê-lo", mas apenas agradecer-lhe. ®Sérgio.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

O SOL DA MEIA-NOITE

O poeta e diplomata João Cabral de Mello Neto (1920-1999), estava sempre a dizer que uma de suas grandes frustrações era não ter sido jornalista. Aos 16 anos foi rejeitado por um jornal. A rejeição lhe afetou tanto que, segundo ele, uma enxaqueca do lado esquerdo passou a lhe incomodar por 50 anos. Dor que médico nenhum foi capaz de detê-la.
Ouviu muitas recomendações de simpatias. Entretanto, atendeu a sugestão de um parente, que lhe recomendou um sanatório. "Foi uma internação que durou cerca de seis meses. Mas apesar disso – dizia – não produziu qualquer resultado positivo. Só deixou más lembranças".
Sem esperança de cura, o poeta apelou para a aspirina. Passou a tomar 10 comprimidos por dia; um a cada 4 horas, regularmente; o que o impedia de ter uma noite de sono inteira. Contudo, vivia agradecido a pírula, que passou a chamar de "sol artificial" e a homenageou no inusitado poema Num Momento a Aspirina:
Claramente, o mais prático dos sois,
O sol de um comprimido de aspirina;
De emprego fácil, portátil e barato,
Compacto de sol na lápide sucinta.
Principalmente por que, sol artificial,
Que nada limita a funcionar de dia,
Que a noite, não expulsa, cada noite,
Sol imune às leis de meteorologia,
A toda hora em que se necessita dele
Levanta e vem (sempre num claro dia):
Acende, para secar a aniagem da alma,
Quará-la, em linhos de meio-dia.
Convergem: a aparência e os efeitos
Da lente do comprimido de aspirina:
O acabamento esmerado desse cristal,
Polido a esmeril e repolido a lima,
Prefigura o clima onde ele faz viver
E o cartesiano de tudo nesse clima.
De outro lado, porque lente interna,
De uso interno, por detrás da retina,
Não serve exclusivamente para o olho
A lente, ou o comprimido de aspirina:
Ela reenfoca, para o corpo inteiro,
O borroso de ao redor, e o reafina.
Mas, 10 comprimidos ingeridos ao longo de 50 anos, só podia causar, ao trato digestivo, úlceras. Então chegou o dia que o poeta pernambucano necessitou de uma cirurgia emergencial. Mas, como há coisas que não tem explicação, João após a cirurgia, aos 66 anos, pode comemorar o desaparecimento da dor de cabeça. ®Sérgio.

terça-feira, 5 de julho de 2011

ALFINETADAS LITERÁRIAS

Harold Bloom (1930), autor de Contos e Poemas para Crianças Extremamente Inteligentes de Todas as Idades, em uma entrevista pública, provoca abertamente Joanne Kathleen Rowling (1965), conhecida como J. K. Rowling e autora dos sete livros da famosa e premiada série Harry Potter: "Como ler Harry Potter e a Pedra Filosofal? Rapidamente, para começar, e talvez também para acabar logo. Por que ler esse livro? Presumivelmente, se você não pode ser convencido a ler nenhuma outra obra, Rowling vai ter que servir".
Oscar Wilde também não deixou por menos; perguntado sobre Alexander Pope (1688-1744) um dos maiores poetas britânicos do século XVIII, disparou: "Existem duas formas de se odiar poesia: uma delas é não gostar, a outra é ler Pope". ®Sérgio.
Salve-se quem puder!

segunda-feira, 4 de julho de 2011

A COLHEITA DO DIABO - Recontando Contos Populares

São Pedro morava ao lado da casa do diabo. Quando chegou o tempo da colheita de batatas doces na chácara de São Pedro, este chamou o diabo e perguntou-lhe:
— Quer ajudar-me a colher as batatas? Eu lhe darei metade da produção.
O diabo pensou um pouco e achando que era bom negócio, respondeu:
— Está bem. Vamos fazer a colheita.
Saíram com o sol saindo, e, ao chegarem à horta onde estavam plantadas as batatas doces, São Pedro perguntou ao diabo:
— Agora, você tem de escolher: quer ficar com a metade de cima da terra, ou com a metade debaixo?
O diabo respondeu:
— Ora essa! Quero ficar com a metade de cima da terra!
Sem mais delongas, São Pedro aceitou o acordo:
— Está bem; pode colher sua parte; quando terminar, virei colher a minha!
De daí, depois que o diabo cortou todas as ramas de batata doce e as levou para a casa dele, São Pedro voltou ao terreno e arrancou as batatas que tinham ficado debaixo da terra. Satisfeito com a colheita, ofereceu um grande almoço e até convidou o diabo para à sua mesa. O diabo, que não conseguiu comer as ramas colhidas, ficou alumiando de raiva e com muita inveja do santo, prometendo a si mesmo que se vingaria.
Passados alguns dias, São Pedro encontrou-se novamente com o diabo e perguntou-lhe se queria ajudá-lo a colher repolhos de sua horta. O diabo aceitou imediatamente, mas foi logo dizendo que dessa vez seria ele a ficar com a parte debaixo da terra. São Pedro que não é bobo - concordou. Então, o seguinte é esse: irei colher minha parte e deixarei a sua no terreno.
E, São Pedro colheu todas as bonitas cabeças de repolho, deixando para o diabo somente as raízes.
O diabo, se sentido logrado outra vez, redobrou a vontade de vingar-se do santo e aceitava todos os convites que este lhe fazia para colher os produtos de sua chácara, mas nunca acertava na escolha: quando a planta dava em cima da terra, ele preferia a parte debaixo; quando dava embaixo, ele preferia a parte de cima. E assim, fez as colheitas de mandioca, de alface, de amendoim, de tomates e outras tantas.
Todos os dias, depois que passaram esses, o diabo está pelejando para ver se engana São Pedro - sem conseguir. ®Sérgio.

O TERMO BARDO

Atualmente o termo "bardo" é usado como sinônimo de "poeta". Entretanto, originalmente, esse vocábulo significava – entre galeses, irlandeses e escoceses – a espécie de poetas e cantores, que empregavam o talento para elogiar os príncipes e reis, celebrar feitos de guerra e conservar a memória das classes aristocráticas. Alem disso, elaboravam, às vezes, poesia de cunho satírico. Não seria sem razão dizer que o "bardo" correspondia ao "trovador" da poesia trovadoresca.
Lá pelo século VI, alguns brados emigraram para a Betranha francesa, levando seus poemas e canções. Ora prestigiados, ora em desgraça, conseguiram se mantiver até o século XVIII, então reduzidos a condição de vagabundos ou mendigos. ®Sérgio.