quarta-feira, 31 de julho de 2013

A LENDA DO HOMEM CHUVA

Begorotire era um índio cabelos negros e muito forte. Certo dia, porém, na divisão da caça, foi "passado para trás". Injustiçado ficou furioso e, por causa disso, decidiu que sairia à procura de outro lugar para viver. Pintou toda a família com uma tintura preta que havia retirado do fruto do jenipapo. Pegou um pedaço de madeira pesada e resistente, da qual fez uma borduna Caiapó (grupo indígena habitante da Amazônia brasileira), com o cabo trançado em preto e a ponta tingida com sangue da caça. Chegou então ao alto de uma montanha, levando sua borduna, e começou a gritar. Seus gritos soaram como fortes trovões. Girou fortemente sua arma no ar e de suas pontas saíram relâmpagos. Em meio ao barulho e às luzes, Begorotire, com os olhos alumiados, subiu aos céus. Os índios assustados atiraram suas flechas, mas não conseguiram impedir que Begorotire desaparecesse no firmamento.
As nuvens, também assustadas, derramaram chuva que parecia que o mundo vinha abaixo. Por isso Begorotire tornou-se o homem chuva. Tempos depois, levou toda a família para o céu, onde nada lhes faltava, e de lá muito fez para ajudar os que na terra ficaram. Juntou sementes de suas fartas roças, secou-as sobre o girau e entregou a uma de filhas para trazê-las a terra.
A pequena índia desceu dentro de uma cabaça enorme amarrada a uma longa corda, tecida com as próprias ramas do vegetal. Caminhando pela floresta, um jovem encontrou a cabaça, amarrou-a com os cipós e pedaços de madeira e, com ajuda dos amigos levou-a para a aldeia. A mãe, abrindo a cabaça, encontrou a índia, a filha da chuva, que estava magra e com longos cabelos, por lá haver permanecido muito tempo.
A jovem foi retirada e alimentada, e teve seus cabelos aparados. Ao ser indagada, a filha da chuva explicou por que viera, entregando-lhes as sementes enviadas por seu pai e deixando a todos muito felizes. O jovem que encontrou a cabaça casou-se com a moça, passando esta a morar novamente na terra. Com o tempo, resolveu visitar os pais. Pediu ao esposo vergasse um pé de Pindaíba, trazendo a copa até o chão. Sentou-se sobre ela e, ao soltarem a árvore, a índia foi lançada ao céu. Ao retornar, trouxe consigo toda a família e cestos repletos de bananas e outros frutos silvestres. Begorotire ensinou a todos como cultivar as sementes e cuidar das roças, regressando depois ao seu novo lar. Ate hoje, quando as plantas necessitam de água, o homem chuva provoca trovões, fazendo-a cair sobre as roças para mantê-las sempre verdes e fartas. ®Sérgio.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

O SONETO DO SEU GREGÓRIO

A capacidade, a habilidade e o ardil satírico de Gregório de Matos, deixam- me, sobremaneira, desconcertado. Com que facilidade, esse artífice do verso, trabalhava seus poemas. Veja:
De acordo com fontes históricas, certa vez, um conde pediu a Gregório de Matos que fizesse um soneto em seu louvor. O poeta, porém, não achou nele nada que pudesse ser enaltecido. Não querendo desagradar o nobre conde, compôs assim mesmo o soneto que vai abaixo:

   Um soneto começo em vosso gabo¹              (¹ louvor)
Contemos essa regra por primeiro,
Já lá vão duas, e esta é a terceira,
Já este quartetinho está no cabo²                  (² no fim)
Na quinta torce agora a porca o rabo:
A sexta vá também desta maneira,
Na sexta entro já com a grã³ canseira           (³ grande)
E saio dos quartetos muito brabo.
Agora nos tercetos que direi?
Direi que vós senhor, a mim me honrais,
Gabando-vos a vós, e eu fico um Rei.
Nesta vida um soneto já ditei,
Se desta agora escapo, nunca mais;
Louvado seja Deus, que o acabei.
Com que maestria Gregório compôs este soneto. O poeta obedecendo à estrutura do soneto e a ela referindo-se com palavras bebidas aqui e ali, ele esvaziou o conteúdo e não se comprometeu em falsos elogios. É por coisas assim que tenho de admirar a qualidade saborosa desse poeta. ®Sérgio.

CRUCIFICA-O, CRUCIFICA-O!

Por diversas vezes, questionei o porquê de no julgamento de Jesus Cristo, a multidão de Jerusalém ter escolhido que Barrabás (era costume, naquela época, libertar um prisioneiro na Festa da Páscoa) fosse solto, em vez de Jesus. Pois, em Mateus 21/8-11, Jesus entrou triunfalmente em Jerusalém com a multidão espalhando roupas pelo chão para Cristo passar. Ser trocado por Barrabás é uma cena tão ultrajante que nos faz questionar o motivo.
Pilatos queria soltar Jesus (Lucas 23/20). Teve até o impulso emocional da esposa, que reconheceu que Jesus era justo e disse ao marido que não se envolvesse naquilo. Depois Pilatos perguntou à multidão: "Que mal este fez?" (Lucas 23/22). Pilatos começa afirmando que Jesus é inocente, mas acaba concedendo a sentença de morte que a multidão exigiu (fico imaginando o barulho ensurdecedor da multidão gritando naquele lugar, em favor de Barrabás, a cada indagação de Pilatos). Diz-nos o estudioso H. Brownlee Reaves, que a multidão foi incitada pelos sacerdotes para o crucificarem.
Em livros e filmes, Barrabás é geralmente descrito como um homem mal, um criminoso. Mas ele pode realmente ter sido um combatente da liberdade na resistência judaica aos romanos, pois era integrante de um partido judeu que lutava contra a dominação romana. Foi preso após um ataque a um grupo de soldados romanos na cidade de Cafarnaum, onde possivelmente um soldado foi morto. Daí a teoria de que Barrabás foi escolhido porque era um tipo de “sicário”, ou seja, judeus que saiam armados de punhais para matar romanos na calada da noite como uma forma de vingança pela destruição do templo pelo imperador romano Vespasiano. Por isso, os sicários eram assassinos amados pela população. Evidência para isso pode ser encontrada em Marcos 15/07, que nos diz que ele estava na prisão porque tinha tomado parte em um levantamento recente. De fato, alguns estudiosos bíblicos acham que ele foi um líder rebelde importante. Se assim for, isso explicaria por que a multidão gritava por sua libertação.
Então, quando ocorreu o inimaginável, o que fez Barrabás? Será que ele decidiu dedicar a vida a Deus porque tinha recebido a liberdade? Será que ele se arrependeu e fez boas obras o resto da vida, tentando ser digno de seu bom nome, ou será que voltou à vida de crimes e degradação? ®Sérgio.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

O EUFEMISMO - Figuras de Linguagem

O eufemismo é uma espécie de perífrase, ou seja, é atenuação, a substituição - por motivos religiosos, éticos, supersticiosos ou emocionais - de uma palavra ou expressão de sentido rude, desagradável, por outra de sentido agradável ou menos chocante. Por exemplo, a infinidade de eufemismo popular para dissimular o nome do Diabo: Arrenegado, Cão, Coisa-ruim, Tinhoso, etc.
[...] pelo menos ele descansou.
A utilização do verbo descansar atenua o impacto da ideia de "morrer". A morte, na nossa cultura, ê considerada algo desagradável, assustador, daí a grande quantidade de eufemismos criados e utilizados para designar essa ideia - falecer, passar desta para a melhor, ganhar a vida, etc.:
  Depois de muito sofrimento, entregou a alma ao senhor.
  Quando a indesejada da gente chegar. (Manuel Bandeira)
  Era uma estrela divina que ao firmamento voou! (A. de Azevedo)
Expressões populares como: Ir para a terra dos pés juntos; Comer capim pela raiz; Vestir o paletó de madeira; são exemplos de eufemismo, porém o caráter cômico dessas expressões em situações de grande impacto como a morte, subtrai a função do eufemismo.
Outros exemplos:
  Ele faltou com a verdade. (= mentiu)
  [...] trata-se de um usurpador do bem alheio. (= ladrão)
  Vivia de caridade pública. (= esmolas) (Machado de Assis)
  O aluno foi convidado a sair da escola. (= expulso da escola)
  Paulo não foi feliz nos exames. (= foi reprovado)
  Enriqueceu por meios ilícitos. (= roubou)
  Querida, ao pé do leito derradeiro. (= túmulo) (A. de Azevedo)

Como se vê, no eufemismo, existe uma intenção, por parte do falante ou do escritor, de não chocar o seu interlocutor ou leitor. ®Sérgio.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

O DILÚVIO SEGUNDO A MITOLOGIA GREGA

A mitologia grega desde a sua criação conheceu várias épocas, que a história batizou de Idades. Na primeira delas, a Idade do Ouro, todos eram felizes. Reinavam a verdade e a justiça, não havia juízes para ameaçar ou punir. A velhice não existia, tampouco as doenças. Reinava uma primavera permanente, os alimentos brotavam da terra por si só.
Depois dessa idade feliz seguiu-se a Idade da Prata, nela Zeus (Júpiter) reduziu a primavera e dividiu o ano em estações. Pela primeira vez o homem teve de sofrer os rigores do calor e do frio. Tornou-se necessário plantar para colher.
Veio a Idade do Cobre na qual começaram as disputas entre os homens, até que se chegou, finalmente, à Idade do Ferro. Nessa idade a violência propagou-se pela Terra. O hospede não se sentia em segurança na casa em que se hospedara; os genros e sogros, os irmãos e irmãs, os maridos e as mulheres não podiam confiar um nos outros. Os filhos desejavam a morte dos pais, a fim de lhes herdar a riqueza. A paz abandonou definitivamente a Terra.
Vendo então o estado das coisas, Zeus indignou-se e convocou os deuses para um conselho. Convocado o conselho dos deuses, todos obedeceram e tomaram o caminho do palácio do céu. Esse caminho pode ser visto no céu em todas as noites claras, a chamada Via Láctea, e ao longo dela fica os palácios dos deuses ilustres; a plebe celestial vive à parte, de um lado ou do outro.
O Dilúvio de Deucalião.
Dirigindo-se à assembléia, Zeus expôs as terríveis condições que reinavam na terra e encerrou suas palavras anunciando a intenção de destruir todos os seus habitantes e fazer surgir uma nova raça diferente da primeira, que seria mais digna de viver e saberia melhor cultivar os deuses. Tomou o seu raio, e já ia despedi-lo contra o mundo, destruindo-o pelo fogo, quando percebeu o perigo que um incêndio teria para os próprios deuses. Decidiu então inundar a Terra. O vento norte que espalha as nuvens foi aprisionado; o vento sul foi solto e em breve cobriu todo céu com escuridão profunda, torrentes de chuva caíram; as plantações inundaram-se. Não satisfeito com suas próprias águas, Zeus pediu ajuda de seu irmão Poseidon (Netuno). Este soltou os rios e lançou-os sobre a Terra. Ao mesmo tempo sacudiu-a com um terremoto e lançou o refluxo dos oceanos sobre as praias. Rebanhos, animais, homens, casas e templos foram tragados pelas águas. De todas as montanhas, apenas a do Parnaso ultrapassava as águas. No entanto, Zeus resolveu poupar da destruição um homem e sua esposa, que considerava os únicos justos sobre a face da Terra. Deucalião e Pirra eram seus nomes.
Avisado do dilúvio, Deucalião construiu um barco de madeira para salvar sua esposa e levar mantimentos. Ao verem que tudo naufragava sob as ondas impetuosas, Deucalião abraçou-se à esposa, e foram ambos refugiar-se no barco. Durante nove dias e nove noites o casal vagou pela água dentro do barco. No décimo dia, o barco encalhou no Monte Parnasos. Quando Zeus viu que apenas eles haviam sobrevivido ao dilúvio, cessou a tempestade e Poseidon retirou as suas águas. ®Sérgio.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

DIZER “O QUÊ” ou “O QUE”...?

Diz a regra que escreve-se o "que" com acento para indicá-lo como monossílabo tônico, da mesma forma que se faz com dê, lê, sê. Essa tonicidade ocorre com o "que" quando interjeição ou substantivo e quando pronome no final da frase.
Por outro lado, há um caso que deixa o escrevedor em dúvida. É o que se pode ver, por exemplo, quando o "que" soa como tônico, mas não vem no fim da frase de sentido completo que se conclui com um ponto final, de exclamação ou de interrogação. É para destacar essa tonicidade que alguns escrevedores usam o "que" acentuado no meio da frase, ou antes, de acabado o período:
  Dizer o quê, Fernando?
  Está pensando em quê, Maria?
Convém ter-se presente que, nesses casos, não se pode considerar o acento gráfico um erro. Entretanto, em termos práticos, não é uma boa opção ignorar a gramática e acentuar o "que" situado no meio da frase:
  Por que, professor?
  Vamos fazer o que, Carlos? ®Sérgio.