quarta-feira, 24 de março de 2010

SE HOUVER AMIZADE... - Seleta de Poemas

Como pensar, que um físico, cientista, matemático, voltado para o exato, para o lógico, pudesse compor um poema sobre a amizade tão significante como este. Pois é..., ele escreveu.
A AMIZADE
Pode ser que um dia deixemos de nos falar…
Mas, enquanto houver amizade,
Faremos as pazes de novo.
Pode ser um dia que o tempo passe…
Mas, se a amizade permanecer,
Um do outro há de se lembrar.
Pode ser que um dia nos afastemos…
Mas, se formos amigos de verdade
A amizade nos reaproximará.
Pode ser que um dia não mais existamos…
Mas, se ainda sobrar amizade,
Nasceremos de novo um para o outro.
Pode ser que um dia tudo acabe…
Mas, com a amizade construiremos tudo novamente,
Cada vez de forma diferente;
Sendo único e inesquecível cada momento
Que juntos viveremos e nos lembraremos para sempre.
Albert Einstein (1879 – 1955). ®Sérgio.

sábado, 20 de março de 2010

JUSTIÇA À MODA ANTIGA

É verdade que o abuso sexual existe desde o tempo do guaraná de rolha, mas também é verdade que é um dos crimes urbanos que mais tem crescido de uns tempos para cá. Tanto é que nunca tivemos tantos estupradores seriais killers.
O abuso sexual compreende o estupro, o assédio sexual e a pedofilia. Esta, então, depois que a internet deu aos pedófilos o Orkut, os chats e o anonimato... Antes, não sei se por falta de divulgação, pouco se ouvia falar nos abusos sexuais. Hoje, pela extensão da comunicação, até a Santa Igreja entrou na lista. Comenta-se, que, tal fato se dá, porque as leis, aqui no Brasil, para esses crimes não tem o rigor que deveria ter. Em razão disso, recordei-me de uma antiga e preciosa sentença judicial que me foi repassada por um amigo.
O Jornal da Cidade, de Sergipe, descobriu, em duas folhas manuscritas (daquelas de livro de cartório) que se encontravam arquivadas no fórum municipal da cidade de Gararu (SE), uma rigorosa sentença judicial por abuso sexual, executada no ano de 1833. O jornal a publicou na integra, em uma edição de julho de 2007. Dizia o seguinte:
O adjunto de promotor público, representando contra o cabra Manoel Duda, porque no dia 11 do mês de Nossa Senhora Sant Ana quando a mulher do Xico Bento ia para a fonte, já perto dela, o supracitado cabra que estava de tocaia em uma moita de mato, sahiu della de supetão e fez proposta a dita mulher, por quem queria para coisa que não se pode trazer a lume, e como ella se recuzasse, o dito cabra abrafolou-se, deitou-a no chão, deixando as encomendas dela de fora e ao Deus dará. Elle não conseguiu matrimônio porque ella gritou e veio em assucare della Nocreto Correia e Norberto Barbosa, que prenderam o cujo, em flagrante.
    Dizem as leises que duas testemunhas que assitiam à qualquer naufrágio do sucesso faz prova. Considero que o cabra Manoel Duda agrediu a mulher de Xico Bento para conxambrar com ella e fazer chumbregâncias, coisas que só marido della competia conxambrar, porque casados pelo regime da Santa Igreja Cathólica Romana. Que o cabra Manoel Duda é um suplicante deboxado que nunca soube respeitar as famílias de suas vizinhas, tanto que quis fazer conxambranas com Quitéria e Clarinha, moças donzellas; Que Manoel Duda é um sujeito perigoso e que se não tiver uma causa que atenue a perigança dele, amanhan está metendo medo até nos homens. Condeno o cabra Manoel Duda pelo malefício que fez à mulher do Xico Bento, a ser CAPADO, capadura que deverá ser feita a MACETE. A execução desta peça deverá ser feita na cadeia desta villa. Nomeio carrasco o carcereiro. 
Cumpra-se e apregue-se editais nos lugares públicos.
Vila de Porta da Folha (Sergipe), 15 de outubro de 1833.
Manoel Fernandes dos Santos
Juiz de Direito
Bons tempos esses. É ou Noé? ®Sérgio.

domingo, 14 de março de 2010

A TEORIA DOS OSSOS

Poucos são aqueles que desconhecem a teoria de Charles Robert Darwin. Também, não é novidade, que antes de Darwin a ciência girava em torno da crença religiosa da criação. A intolerância religiosa era tão poderosa, que nenhum cientista teve, antes de Darwin, argumentos e coragem intelectual de se opor a essa crença. As descobertas eram, ou tinham de ser, pateticamente adaptadas ao dogma religioso. Sendo assim, quando começaram a serem desenterrados ossos de dinossauros e outros animais extintos, o sábio francês Georges Cuvier (1769-1832) ofereceu a mais extraordinária dessas patéticas adaptações:
“São ossos de animais que não conseguiram embarcar na Arca de Noé e morreram no dilúvio bíblico”.
Apesar dos atrasadinhos, imagine só, toda aquela coleção de dinossauros, embarcada na Arca de Noé.
Nem Emma, mulher de Darwin, teve coragem suficiente para somar-se a ele, pois tinha certeza que iria para o céu e seu marido, pela teoria, para o inferno. Ela se torturava com a ideia de passar a eternidade longe do marido.
Salve-se... quem puder! ®Sérgio.

II POVERELLO - Seleta de Poemas

Seleta de Poemas representa as poesias que li e tocaram-me a alma. Assim, posso compartilhar com vocês as minhas preferências poéticas e homenagear os autores que admiro.
Poverello significa o Pobrezinho, diminutivo carinhoso pelo qual era tratado São Francisco de Assis.
II POVERELLO
Desgrenhado e meigo, andava na floresta.
Os pássaros dormiam em seus cabelos.
As feras o seguiam mansamente.
Os peixes bebiam-lhe as palavras.
Dentro dele todo o caos se resolvera,
Numa ingênua certeza: — “Preguei a paz,
Mostrei o erro, domei a força, curei o mal.
Antes de mim o crime. Depois de mim o amor.”
Mas a floresta esqueceu no outro dia,
O bíblico sermão e novamente o lobo comeu a ovelha,
A águia comeu a pomba,
Como se nunca houvera santos e sermões.
José Paulo Paes (1926 - 1998) ®Sérgio.

sábado, 13 de março de 2010

O DEPUTADO QUE FOI PARA O INFERNO

A história que vou lhes transcrever, já percorreu o Brasil. Mas, acho que não faz mal contá-la aqui, a meu modo; pois estou certo de que pelo menos um leitor há de me agradecer a lembrança.
Contam que um conhecido político, muito chegado a uma falcatrua - que já tinha passado pela vereança e agora era sua excelência deputado e presidente duma tal comissão de ética - certo dia, num bate-boca com seus pares, subitamente, sentiu-se mal e bateu as botas. Morto, não teve conversa, foi direto para o inferno. Lá chegando, foi logo pedindo uma audiência com o Diabo e explicando:
— Companheiro Diabo, lá embaixo eu era amigo duns caciques e de outros que já vieram a minha frente e estão, agora, articulando politicamente em causa de vossa excelência. Portanto, eu lhe pergunto: qual vai ser meu gabinete aqui no inferno?
O satanás, muito calmo, lhe explicou que o inferno estava dividido em diversos departamentos, cada um administrado por um país, porém o nobre colega não precisava ficar no departamento administrado pelo país de origem dele. Podia ficar no departamento do país que escolhesse. O deputado falecido agradeceu muito e tratou de dar uma voltinha para escolher o departamento e quem sabe reencontrar velhos amigos.
Não andou uma quadra e deu com o departamento dos Estados Unidos; pensou que um gabinete ali seria um grande negócio, pois este deveria ser o departamento mais organizado do inferno e lhe daria grandes privilégios. Entrou no departamento e perguntou como era o regime ali.
— Pela manhã, depois de passar três horas num forno a trezentos graus, trezentas chibatadas. Na parte da tarde: ficar numa geladeira a 200 graus abaixo de zero durante três horas, e voltar ao forno de trezentos.
O deputado ficou abestalhado. Isso não era tratamento que se dava a uma excelência falecida. Puro preconceito e perseguição política dos gringos. E tratou logo de cair fora dali. Passou pelo departamento português, italiano, russo e japonês; tudo igual, em todo o lugar era o mesmo: chibatadas e forno pela manhã, geladeira e forno pela tarde. O deputado falecido chegou à conclusão que não tinha privilégio no inferno e lamentou ter morrido antes de chegar a ser senador.
Caminhava desconsolado, quando viu um departamento, no qual uma placa acima do batente da porta, ostentava o nome: Brasil. Aproximou-se e notou uma imensa fila à porta do departamento, coisa que ele não tinha visto em nenhum outro. Logo pensou: "aqui tem coisa". Entrou na fila e começou a chatear o camarada da frente, perguntando por que ali havia fila e ninguém reclamava de nada. O pecador da frente fingia não ouvir, mas ele tanto insistiu, que o da frente, com medo de despertar a atenção dos serviçais do diabo, disse baixinho:
— Fica na tua e não espalha não. O forno daqui tá quebrado, não funciona; a geladeira, quando funciona não passa dos trinta graus.
— E as trezentas chibatadas? Perguntou a excelência.
— Capaz... O funcionário encarregado desse serviço vem aqui de manhã, assina o ponto e sai fora.
Salve-se quem puder! ®Sérgio.

sexta-feira, 5 de março de 2010

A ENCOMENDAÇÃO DAS ALMAS

Quando eu era jovem, morei por um tempo numa cidade muito pequena, onde não havia eletricidade e a noite desabava em escuridão completa. Nada era mais triste do que à noite; as casas fechavam-se e em breve as últimas luzes dos lampiões se apagavam.
Os moradores dessa cidade costumavam a realizar muitas práticas religiosas, e não é que poucos meses depois de minha chegada, fui surpreendido por uma delas.
Na noite da véspera do dia de finados, entre onze horas e meia-noite, os sinos da matriz principiaram a repicar enchendo o ar de vibrações... Aos primeiros repiques, os residentes da cidade e das terras mais próximas, começaram a se reunir diante da igreja. Olhava-se para a banda do mato, vinha gente. Olhava-se para o lado da igreja, vinha gente. Para onde quer que se olhasse, estava gente chegando. Gente a cavalo, de carro de bois e de a pé, todos vestindo túnicas brancas que cobriam até a cabeça.
Por volta da meia-noite, o ranger dos sinos cessou de todo e a vila parecia ter retornado a tranquilidade... Não fosse a aglomeração diante da matriz. Nisso o capelão aparece à porta tendo a frente o sacristão com uma grande cruz de madeira. O padre capelão rezou, acompanhado pelos presentes, uns versículos da oração dos mortos e deu início à procissão em rogo das almas do purgatório.
Uns levavam lanternas de velas de sebo, outros um berra-boi (um cordão com peso na ponta e que é girado rápido, provocando forte e sinistro zumbido) ou a matraca; todos, porém, de rosários nas mãos. O desfile, guiado pela grande cruz, tinha o objetivo de fazer orações para as almas sofredoras ou para os que morreram de acidentes (como picadas de cobra) ou de doenças.
Os fiéis, ora rezavam rosários, ora cantavam ladainhas e rogatórias extensas, que tinha por princípio os versos abaixo:
Alerta, alerta pecadores!
Acordai quem está dormindo;
Veja que o sono é irmão da morte
E a cama é a sepultura!
Nas ruas em que a procissão atravessava, as residências estavam hermeticamente fechadas, como era o costume. Em certo ponto da caminhada, uma janela se entreabriu e foi furiosamente alvejada por uma saraivada de pedras. Um caboclo robusto disse-me, de dentro de sua túnica, que o curioso - que conseguisse olhar a procissão - veria apenas um rebanho de ovelhas brancas, conduzido por um frade sem cabeça. Disse-me, ainda, que a procissão não podia parar para nada. Tinha de estar sempre em movimento. Se parasse na frente duma casa, era desgraça na certa para o dito cujo. Até tiro davam se havia ameaça de parar.
Saindo de uma viela estreita, o cortejo pegou, em campo aberto, a estradinha que acabava no velho cemitério da cidade. Lá chegando, todos, rezando orações em voz alta, entraram na morada dos mortos e detiveram-se ao pé do cruzeiro. Ali, embalados por cânticos de ladainhas e rogatórias, alguns fiéis iniciaram a flagelação penitencial (uma mescla de prazer e dor), com chicotes de couro de nove correias, conhecido como gato de nove rabos, porque têm nas pontas unhas de metal, semelhantes a dos felinos, e que causam graves ferimentos, deixando os penitentes em tratamento por vários dias. Os sinistros batidos das matracas e os gemidos dos flagelantes me causaram tremendo mal-estar.
Outras atividades aconteceram ao pé do cruzeiro... porém, me foi proibida a revelação, caso contrário, é desgraça na certa para mim; como não quero ver para crer, vou ficando de bico calado. Inté! ®Sérgio.

quarta-feira, 3 de março de 2010

MUNDO ESTRANHO

Este mundo é mesmo estranho. Imagine: mulheres esvaziando fossas sépticas e carregando os excrementos humanos numa cesta sobre a cabeça; mesmo nos dias de chuva quando a água dilui as fezes que inevitavelmente escorrem pelos rostos dessas mulheres.
Pense em homens abrindo bueiros donde saem baratas e ratos. Quando o movimento de fuga dos pestilentos diminui, esses homens, só de tangas fio-dental, entrando nesses bueiros para desobstruir as tubulações. Sem luvas ou máscaras (no máximo pás, baldes e carriolas), para amontoar do lado de fora a massa escura, mistura de fezes e tudo o mais que você possa imaginar.
Pois é; esse é o trabalho de 650 mil indianos, os chamados "scavengers", termo inglês que significa, mais ou menos, animais que se alimentam de carniça.
Scavengers são dalits, a mais baixa casta indiana e hereditária, ou seja, nascem para trabalhar nas fossas. Muitos morrem envenenados pelo gás metano (fermentação das fezes) que se acumulam nas galerias ou afogados nos excrementos.
Pior; na sociedade indiana, ninguém se incomoda com isso. Tanto que essas mulheres e esses homens são contratados por empresas a serviço do poder público, em cidades como Mumbai e Nova Délhi.
E ainda tem gente que diz: "Meu emprego é uma merda". ®Sérgio.

O ESTILO - Reflexões Literárias

"O estilo é o sol da escrita. Dá-lhe eterna palpitação, eterna vida. Cada palavra é como que um tecido do organismo do período. No estilo há todas as gradações da luz, todas as escalas dos sons.

O escritor é psicólogo, é miniaturista, é pintor – gradua a luz, tonaliza, esbate e esfuminha os longes da paisagem.

O princípio fundamental da Arte vem da Natureza, porque um artista faz-se da Natureza. Toda a força e toda a profundidade do estilo esta em saber apertar a frase no pulso, domá-la, não a deixar disparar pelos meandros da escrita.

O vocábulo pode ser música ou pode ser trovão, conforme o caso. A palavra tem a sua anatomia; e é preciso uma rara percepção estética, uma nitidez visual, olfativa, palatal e acústica, apuradíssima, para a exatidão da cor, da forma e para a sensação do som e do sabor da palavra." (Cruz e Souza. Outras Evocações. In: Obra Completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1961, p. 677-8)