sábado, 2 de novembro de 2013

MALASARTE E AS JOIAS

Viajando sem destino fixo, errante, indiferente aos perigos, Malasarte foi dar na fazenda de um fazendeiro ricaço, que era casado e tinha uma filha. Precisando de uns vinténs, dormindo ao relento, à beira do caminho, Malasarte ofereceu-se para trabalhar na casa, e foi aceito pelo fazendeiro ricaço.
Como era tempo de chuva, o chiqueiro estava um lameiro que só vendo. Foi aí que Malasarte teve uma ideia.
Chegando a noite, campeou os porcos para longe e lhes cortou as caudas. Voltando ao chiqueiro, espetou no lameiro as caudas dos porcos.
De manhã, quando o dono da casa veio ver a porcada, Malasarte lhe apontou o lameiro e disse-lhe que os porcos estavam todos atolados, apenas com os rabos de fora. O fazendeiro, desesperado, mandou Malasarte ir correndo ao celeiro buscar duas enxadas para ver se conseguiriam desenterrar os porcos.
Pedro Malasarte foi à carreira; lá chegando, viu a dona e a filha colhendo laranjas no pomar e lhes disse:
— O patrão mandou as senhoras me acompanharem.
Elas duvidaram; então Malasarte gritou ao fazendeiro, perguntando:
— As duas, patrão?
— Sim, as duas, pateta! E sem demora! 
Então, as senhoras não querendo contrariar o fazendeiro, não puseram mais diferença e acompanharam Pedro que tomou, com elas, outra direção.
Bem longe da fazenda, Malasarte amarrou-as numa árvore, tirou-lhes todas as jóias que eram de grande preço, e fugiu com toda a porcada que tinha ocultado ali perto.
Quando o fazendeiro, cansado de esperar pelas enxadas, foi ao seleiro e não encontrou Malasarte, saiu a procurá-lo e acabou achando a mulher e a filha, amarradas a uma árvore e nada de Malasarte.
Quando o fazendeiro voltou ao chiqueiro com a enxada, descobriu que dos porcos só havia os rabinhos, e que ele é que era o verdadeiro pateta.
A muitas léguas dali, Malasarte negociou a porcada com outro fazendeiro. Com o dinheiro, comprou, no vilarejo, um bom jogo de roupas e caiu no mundo, muito do contente. ®Sérgio.

COMO MALASARTE COZINHA SEM FOGO

Aí vai uma história de Pedro Malasarte; história tão certa como ela se passou, que nem contada em letra de forma, ou pregada de púlpito, seria tão verdadeira.
Chegando, certa vez, Pedro Malasarte à cidade, logo se meteu em divertimentos e gastou todo o dinheiro. Mas antes que ficasse de todo limpo comprou uma panelinha de ferro, com três pés para apoiar sobre o fogo, uma matula e seguiu viagem.
Já era por umas onze da manhã, quando avistou um rancho desocupado. Apertado de fome, resolveu descansar ali. Fez fogo, pôs a panela de três pés com a matula a aquecer.
Mal acabara de aquecer a matula, vem chegando uns tropeiros. Pedro Malasarte mais que depressa pôs um monte de terra sobre o fogo, de modo que não ficou um graveto a vista, e ficou muito quieto diante da panelinha que fumegava.
Os tropeiros vendo aquilo ficaram muito espantados e perguntaram:
— Que moda é essa, caboclo, de cozinhar sem fogo?
Pedro respondeu logo:
— Isto não é para todos. Pois não vêem que minha panela é mágica?
— Então, ela cozinha sem fogo?
— É como estão vendo, e a qualquer hora. Mas como o médico me disse que estou por poucos dias e precisando de dinheiro para encomendar o corpo, posso negociá-la.
Os tropeiros viram na panela um verdadeiro achado; provaram da comida e acharam tudo muito bom.
Compraram a panela, pagando por ela o preço que Pedro Malasarte lhes pediu.
Vinha caindo à noite, quando os tropeiros foram cozinhar sem fogo e deram com a trapaça de Malasarte, que já tinha sumido nesse mundo de Deus.
Pois foi assim que aconteceu e já lá vão quarenta e cinco anos ou talvez cinqüenta, que nisto de contagem de anos não sou nenhum sábio da Grécia. ®Sérgio.