quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

MORREU MESMO - Recontando Contos Populares

Um dia, foi um jovem empregar-se na prefeitura de uma cidadezinha do interior. No seu primeiro dia de trabalho lhe mandaram podar as árvores da prefeitura. Como não tinha prática desse serviço e era um tanto tapado, apoiou a escada num dos galhos e pôs-se a serrá-lo. Deu de acontecer que passava por ali, numa mulinha avermelhada e troncha; breviário na mão e guarda-sol aberto, o vigário da freguesia. Ao ver o jovem, advertiu-o:

— Menino, serrando desse modo, vai cair daí!

O novato que era, além de estúpido, teimoso; fingiu não ter escutado o padre, e continuou o trabalho.

O vigário, então, prosseguiu seu caminho. Não passou muito tempo... zás! Vem ao chão tanto a escada, como o jovem podador, que ficou com um braço em petição de miséria. Quando voltou do desmaio e retomou os sentidos, ficou muito admirado do certo que saiu o conselho do reverendo; pensou lá consigo que o padre era um adivinhão e como tinha profetizado sua queda, podia acertar o dia de sua morte.

Foi ter com ele:

— A bença, seu vigário.

— Deus te abençoe.

— Vossa Reverendíssima me falhou que eu havia de cair da árvore e, dito e feito, caí mesmo. Bem... queria que agora adivinhasse o dia de minha morte.

Bonachão, o padre achou muita graça no pedido que o jovem lhe fazia e resolveu zombar um pouco dele.

— Olhe, sei quando você há de morrer. Será na hora em que, indo para sua casa, montado em sua mula, a ouça dar três zurros seguidos.

O jovem podador agradeceu muito e foi-se embora.

Toda vez, que voltava para casa, montado em sua mula, ia muito atento a fim de ouvir quando ela dava os tais zurros. E foi que, certo dia, ao chegar numa volta do caminho, a mula preparou-se toda e soltou um, dois, três zurros.

O jovem, que os havia contado com o coração aos pulos e crente na previsão do reverendo, julgou chegada sua hora. De imediato, atirou-se da sela abaixo e soltou um grito:

— Morri!

Não se moveu mais, certo de que estava morto. Vai daí que, logo depois, passaram por ali uns trabalhadores e deram, de cara, com ele estendido no meio do caminho. Acreditando-o morto, foram buscar uma rede no vizinho mais próximo, puseram-no dentro e o conduziram para sua casa, rezando um terço.

Não muito adiante, havia duas encruzilhadas. Os trabalhadores ficaram bestando: qual delas seria o caminho mais curto para chegarem à casa do morto.

Começaram a teimar entre si, até que o defunto ergueu a cabeça do fundo da rede e lhes disse:

— Olhem, amigos, no tempo em que eu era vivo o caminho mais curto era à esquerda.

Assombrados, os trabalhadores atiraram a rede ao chão, com o defunto dentro, e fugiram a toda disparada.

Com a queda o moço veio a morrer mesmo. E a adivinhação do padre saiu certa. ®Sérgio.

AS FIGURAS FONÉTICAS

Onomatopeia do grego onomatopoiía (= ação de inventar nomes) é a criação de uma palavra a partir da imitação ou reprodução aproximada (nunca exata) de um som natural a ela associado. A onomatopeia transforma-se, assim, num processo de formação de palavras. As onomatopeias têm sua carga significativa na sonoridade e não no conceito, ou seja, velem apenas pelo que significam. Fazem parte do universo da onomatopeia: ruídos, gritos, canto de animais, som de instrumentos musicais ou o barulho que acompanha os fenômenos da natureza:

=> Ergue a voz o tique-taque estalado das máquinas de escrever. (F. Pessoa)

Numa leitura em voz alta, você perceberia, facilmente, os estalos do [t] e [q].

As Onomatopeias Puras - serão puras quando procuram - com os recursos que a língua dispõe - reproduzir, imitar o mais aproximado possível os sons que representam; por exemplo: bip, clic, toc-toc, brrr, atchim, etc. Estas onomatopeias não representam palavras, apenas imitam os sons que representam. São, muitas vezes, formadas apenas por consoantes (zzzz), facilmente pronunciadas, porém difícil de serem representadas ortograficamente. Muitos dos ruídos e sons representados por onomatopeias acabam por se incorporar à língua. Algumas vão até motivar a criação, por derivação, de novas palavras.

As Onomatopeias Vocalizadas estão no campo da gramática e da linguística e constituem palavras como outras quaisquer. Seguem as regras de construção ortográficas e possuem uma classificação sintática e morfológica, como é o caso de roncar e mugir (verbos), que correspondem às onomatopeias puras “ronc e muuu”, respectivamente. Quase todas as onomatopeias puras são passíveis de lexicalização, bastando para tal antepor-se um artigo, por exemplo: o tic-tac, um toc-toc.

Neste fragmento do poema Vozes dos Animais de Pedro Dinis, temos uma boa ilustração das onomatopeias vocalizadas:

Muge a vaca, berra o touro

Grasna a rã, ruge o leão,

O gato mia, uiva o lobo

Também uiva e ladra o cão.

Relincha o nobre cavalo

Os elefantes dão urros,

A tímida ovelha bala,

Zurrar é próprio dos burros.

É de se esperar que as formações nitidamente onomatopaicas fossem, em geral, de caráter universal. Contudo, têm poucas semelhanças nos diferentes idiomas quando se traduzem graficamente. Cada língua convencionou a onomatopeia de uma maneira própria. Por exemplo: auuu (latido de cães) em francês é wou, ou, ouuuu; em russo vau, ou, oouu; beee (ovelhas) é baa em inglês e bäh em alemão.

A onomatopeia é um dos recursos expressivos mais comuns usados na prosa e na poesia para produzir um efeito especial e reforçar a capacidade comunicativa do texto Na poesia tem grande importância estilística e poética, pois nela se concentram a melodia, a harmonia e o ritmo da frase. Os valores sonoros da onomatopeia podem ser reforçados pela aliteração (repetição do mesmo som). Daí a sensível aproximação da poesia a esta figura fonética, como se pode verificar neste fragmento de Vicente de Carvalho:

Ouves acaso quando entardece

Vago murmúrio que vem do mar,

Vago murmúrio que mais parece

Voz de uma prece

Morrendo no ar?

Nestes versos há um conteúdo onomatopaico criado pelo termo murmúrio e reforçado pela aliteração (repetição do termo).

A onomatopeia tornou-se moda durante o Simbolismo, a ponto de atribuir-se a cada vogal uma carga sonora, correspondente a um instrumento: A > órgão — E > harpa — I > violino — O > metais — U > flauta.

Nas histórias em quadrinhos, podemos encontrar inúmeros exemplos de onomatopeias. ®Sérgio.

Neste link há uma lista de onomatopeias puras para o seu texto:

http://recantodasletras.uol.com.br/teorialiteraria/1186781

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Ajudaram na elaboração deste texto:

Helio Seixas Guimarães, Ana Cecília Lessa - Figuras de Linguagem – Atual Editora

Rocha Lima – Gramática Normativa da Língua Portuguesa – José Olympio.