sábado, 30 de outubro de 2010

COMO PRENDER UM DIABINHO NA GARRAFA

Muito antes de me aposentar, desenvolvi com meus alunos um projeto de pesquisa cuja finalidade era o resgate de contos, mitos e lendas da nossa terra, recontados ao longo de nossa história pela tradição oral. A ideia era registrarmos o material colhido em uma brochura.
Hoje, revendo algumas das crendices "pescadas" na oralidade, não consegui conter o desejo de lhes contar um episódio que me foi narrado por um senhor da Mata de Minas, residindo há muito anos em minha cidade.
Segundo seu Joaquim, "a gente" que vivia na região mineira do Vale de São Francisco, chamava de "famaliá" um diabinho, que se conservava preso dentro de uma garrafa. Quem estivesse precisando de dinheiro era só pedir a ele que o dinheiro aparecia na hora.
Se, por acaso, você estiver necessitando de um dinheirinho e quiser aprisionar um famaliá, seu Joaquim tem a receita de como apanhá-los. Isso mesmo, apanhá-los: não um, mas dois deles e colocá-los dentro de uma garrafa. É assim:
Mate um gato preto e tire-lhe os dois olhos.
Ponha cada olho dentro de um ovo de galinha preta.
Enfie os ovos dentro de esterco de cavalo, que ainda esteja quente.
Todo dia, vá até perto do monte e diga: Ó, diabão! Eu te entrego estes dois olhos de gato preto para que me sejas favorável nesta apelação: "Que deles nasçam dois diabinhos para eu cria-los dentro de uma garrafa e me darem dinheiro na hora da precisão".
Diga isso durante trinta dias. Ao fim desse tempo, nascem dois diabinhos no corpo de uma lagartixa. Coloque-os dentro da garrafa e os alimente com pó de ferro ou aço moído (Bombril). Depois é só pedir dinheiro, que aparece na hora.
Mas, nem por sombras, poderíamos imaginar o que iria suceder aos gatos pretos se esta receita chegasse a Brasília. Ou poderíamos?
Salve-se o gato que puder! ®Sérgio.

O DRAMA NA PROSA FICCIONAL

A palavra Drama originou-se na Grécia Antiga (drâma) e designava simplesmente a ação. E como ação representava uma forma exclusiva do teatro.
Como a ação envolve o choque entre personagens, a palavra drama assumiu também o sentido de conflito, e o adjetivo dramático, o de conflitivo. Assim é que, no âmbito da prosa de ficção (conto, novela romance), é valido usarmos o termo drama para rotular a característica mais importante da prosa ficcional: o conflito.
Portanto, drama, dramático, no âmbito da prosa, deve ser entendido como conflito, ação conflituosa. Pois, o drama nasce quando se dá o choque de duas ou mais personagens; seja por contato com o mundo sobrenatural, seja por questões sociais, políticas, familiares, de caráter, ou mesmo com o próprio mundo íntimo duma personagem com suas ambições e desejos contraditórios. Você já se sentiu dividido, sem conseguir optar, querendo e não querendo uma coisa, com medo e com vontade de fazer algo? Então você entende o que é um conflito, um drama.
Se não há drama, não há conflito e, portanto nem história. E mesmo que houvesse uma história, sem drama, sem conflito, não despertaria interesse nenhum.
Os primeiros dramas registrados na literatura podem ser encontrados em Ilíada e Odisséia — são confrontos entre o homem e a natureza, entre o homem e os deuses, entre o herói e seus inimigos militares - todos esses confrontos são explorados nos poemas épicos de Homero.
A solução de um conflito depende das circunstâncias que o iniciaram. Na tragédia clássica, ele deveria ser resolvido dentro do próprio drama, segundo uma regra que assegurava ao espectador sair do espetáculo sem dúvidas sobre o destino e o caráter das personagens. Na dramaturgia e na ficção pós-moderna, por exemplo, explora-se a situação sem saída, o eterno conflito, o mais das vezes, nunca resolvido, ou apenas subentendido ou sugerido. Compete, muitas vezes, ao leitor tirar às conclusões necessárias a solução do conflito da história narrada.
Da Palavra Drama Derivou:
Dramalhão, termo pejorativo de drama, em relação às características desenvolvidas pelo drama após o século XVIII.
Dramaturgia e Dramatologia, sinônimo de arte dramática.
Dramaturgo, autor de dramas, ou seja, de peças teatrais.
De modo geral, podemos dizer que os conflitos envolvendo os protagonistas da ficção se estruturam de três modos:
1º. Conflito do protagonista com outro personagem: o mais tradicional exemplo deste modo de conflito está nas histórias de mocinho e bandido, de herói e vilão.
2º. Conflito do protagonista com um grupo de personagens: um bom exemplo deste caso é aquele investigador que combate sozinho ou com pouca ajuda, a máfia das drogas, crimes cometidos por gangues, etc.
3º Conflito do protagonista com ele mesmo: é o caso das narrativas de forte apelo psicológico, em que o personagem principal vive, com suas ambições e desejos contraditórios, um drama interior. ®Sérgio.
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Ajudaram na elaboração deste texto: PEACOCK, Ronald.  Formas da literatura dramática.  Rio de Janeiro: Zahar, 1968. / O. B. Hardison Jr., Christian Rite and Christian Drama in the Middle Ages – Essays in the Origin and Early History of Modern Drama (1965). / Brasil, Assis. Vocabulário Técnico de Literatura. Rio de Janeiro: Tecnoprint, s.d.