quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

DEVER DE MORRER

Quando o doutor Osvaldo examinou as tomografias de sua nova paciente, uma mulher de cinquenta anos, percebeu que lhe restava pouco tempo de vida. O câncer de mama espalhara-se para o fígado, ossos e pulmões.
Com muito cuidado, o Doutor explicou à paciente o que tinha visto na tomografia, e que as dores que sentia podiam ser aliviadas com medicamentos. No entanto, tais medicamentos, por terem seu uso restrito e sua aplicação estar sob rígido controle, ela teria de ser internada. Ofereceu-lhe, então, uma vaga no hospital público em que realizava os procedimentos médicos. Entretanto, o Doutor percebeu o temor de sua paciente quanto à internação; e só obteve o consentimento depois de lhe garantir que a cuidaria pessoalmente.
Após 24 horas de tratamento com morfina, Ângela se livrou da dor. Embora consciente de que a morte não lhe tardaria, estava calma e em condições de ver o marido e a família. E assim, passaram-se os dias.
No início da noite de uma quinta-feira, a enfermeira liga para a casa do Doutor com notícias nada agradáveis. Conta-lhe que depois que ele deixara o hospital, outro médico entrou no quarto de Ângela e pediu ao marido e à irmã dela que se retirassem, pois iria realizar procedimentos médicos na paciente. Logo após, ordenou à enfermeira, que o acompanhava, que aumentasse a dose de morfina; ordem que ela atendeu prontamente. Porém, quando a enfermeira lhe pediu que confirmasse a ordem por escrito, o médico recusou-se. Minutos depois a paciente estava morta.
O doutor Osvaldo dirigiu-se imediatamente para o hospital. Lá chegando, pediu ao médico uma explicação:
— Poderia levar mais uma semana até que ela morresse - disse-lhe o colega - Eu precisava do leito.
Osvaldo tomado de perplexidade, não conseguiu pronunciar uma palavra sequer. Ainda atônito, foi até a sala de espera do hospital onde encontrou os familiares de sua paciente. Explicava-lhes o motivo que a levou ao óbito, para que tomassem as devidas providências, quando foi interrompido pelo marido de Ângela que lhe exclamou:
— Ela não aguentava mais! Nenhum de nós aguentava!
O doutor Osvaldo Santana abandonou o trabalho no hospital e a carreira médica para se dedicar à outra opção. ®Sérgio.
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Nota Sobre o Texto: Essa história é baseada em fatos reais.