sábado, 22 de janeiro de 2011

UM CASO DE POBREZA - Recontando Contos Populares

Havia numa cidadezinha do interior, uma família que já fora possuidora de muita riqueza, mas que agora vivia na mais profunda miséria. A situação da família chegou a tal ponto, que seus sete membros compartilhavam o mesmo aposento, nunca tinham o suficiente para comer e suas roupas eram verdadeiros trapos. Não é de se admirar que eles vivessem na maior infelicidade, a reclamar pelos cantos o injusto destino. Seu Aristides, o chefe da casa, homem trabalhador, passava o dia todo e todo dia, a andar pela cidade atrás de um trabalho, mas o que aparecia eram apenas uns bicos aqui e ali. Vai daí, que ele ficou sabendo que numa casinha de pau-a-pique, já quase fora da cidade, morava Pai João, um “nego veio” muito sabido que, com bons conselhos, já ajudara muita gente a se aprumar na vida. Aristides, desesperançado, não deixou por menos, foi procurá-lo imediatamente.
— Seu João, a miséria de minha família é tão grande que mal conseguimos continuar vivos, nunca temos o suficiente para comer e estamos começando a odiar-nos uns aos outros. O que devo fazer?
Pai João, meditou por uns instantes e, simplesmente, respondeu:
— Você arruma um bode e "coloca ele" em sua casa por um mês. Então, “meu fio”, seus problemas serão resolvidos.
— Um bode? Viver com um bode? - Retruca Aristides, atônito.
Mas, pai João insiste.
E já que ele sabia das coisas, Aristides atendeu ao conselho.
Nos dias que se seguiram, a vida infernal daquela família foi além do tolerável. O bode comia tudo e o que via; não havia mais roupas porque o bode as comia também. A casa tornou-se uma verdadeira lixeira. Se já havia desavença dentro dela, agora se tornara explosiva. No final do mês, Aristides voltou à casa de pai João, doido da vida:
— Estamos vivendo há um mês com um bode dentro de nosso casebre. Tem sido horrível. Como pode ter dado um conselho, assim, tão ridículo?
 Seu João sacudiu lentamente a cabeça concordando, e diz:
— Agora se livre do bode e verá como suas vidas se tornarão calmas e tranquilas.
Nego veio tá certo! Quem acha que a vida tá ruim, coloque um bode nela, e vai ver o que é ruim, de fato. ®Sérgio.

O ESPELHO - Recontando Contos Populares

Conta-se que, lá pelos idos de antigamente, um vaqueiro resolveu fazer uma viagem até a cidade grande. Nas suas andanças por lá, viu em um bazar, pela primeira vez, um espelho - objeto até então desconhecido para ele. Quando olhou sua imagem refletida no espelho, julgou reconhecer ali o rosto do pai. Maravilhado com aquela magia, comprou o espelho.
Ao chegar a sua fazendinha, carregando na algibeira sua compra mais preciosa, foi ao celeiro e guardou-o num pequeno baú, onde também guardava sua vestimenta de vaqueiro. Sempre que se sentia triste e solitário, ia ao celeiro, abria o baú, e ficava contemplando o rosto do pai.
Sua mulher - que nada sabia do espelho - começou a notar que sempre que ele ia ao celeiro, saía com um aspecto diferente, isto é, com um "ar de felicidade". Desconfiada, começou a assuntá-lo. Por uma fresta na madeira, viu que o marido abria o baú e ficava longo tempo olhando para dentro dele.
Um dia, depois que o marido saiu para uma vaquejada, ela foi até o celeiro, abriu o baú e viu espantada, dentro dele, o rosto de uma mulher. Cheia de ciúme, esperou o marido chegar e pediu explicações sobre a mulher que ele guardava no baú. Mas o vaqueiro sustentava que era o seu pai que estava no baú. Armou-se então uma grande confusão familiar. Por sorte, uma beata tida como muito instruída e que não sabia mentir, ficou sabendo do caso e querendo esclarecer de vez a discussão, dirigiu-se a casa do vaqueiro. Lá chegando, foi logo pedindo que lhe mostrassem o baú. O vaqueiro e sua mulher a levaram até o celeiro e lhe mostraram o baú. A beata pediu-lhes que esperassem lá fora, enquanto veria o que havia no baú. Passado alguns minutos, ela grita de dentro do celeiro:
— Ora gente, vocês estão brigando em vão: nesse baú não há homem, nem mulher, mas somente uma beata como eu! ®Sérgio.