Conta o povo, que viviam num lugar pequeno, muito
afastado dos centros mais civilizados, dois homens que se queriam muito mal. Os
moradores da região tentaram de tudo para fazê-los amigos; porém, como o ódio
era de coração, não durava neles a amizade que prometiam. Esse ódio, cada vez
mais forte, acabou incomodando o Criador. De maneira, que ele resolveu enviar a
Terra um de seus assistentes, a fim de inquirir ambos os homens, o melhor que
pudesse, para saber a causa de tanto ódio; porque sabendo o princípio do mal,
mais fácil se faria a paz.
O Criador logo tomou ciência de que era pura inveja
que cada um tinha dos bens e da fazenda do outro, porque nisto eram quase
iguais e abastadamente ricos; porém, cada um desejava ver-se acima do outro,
ainda que fosse à custa de ver o outro perdido e destruído. O mesmo mal que um
queria ao outro, lhe queria o outro a ele.
Desejoso de levar a paz a ambos, o Criador envia
outro emissário, que os encontra em pleno bate-boca e lhes diz:
— Sejam amigos e nosso Pai terá o prazer de lhes dar
tudo o que quiserem pedir do Reino dele. Porém, com uma condição: o que um
pedir, para não haver inveja, ao outro ele dará em dobro.
Eles, a primeira vista, aceitaram e agradeceram ao
emissário, crendo que cada um ficaria avantajado ao outro; porém quando caíram
na conta que, ainda que um pedisse muito, o outro receberia dobrado; nenhum
queria ser o primeiro a pedir, para não ficar com menos que o vizinho.
Tal situação irritou o Criador que desceu a Terra e
lhes ordenou que sorteassem a quem coubesse pedir primeiro. Feito o sorteio,
àquele que coube pedir, ficou um instante a meditar e depois prosseguiu, nestes
termos:
— Senhor, eu já sei o que hei de pedir e se cumprir
a sua palavra, ficarei contente e amigo do meu vizinho.
O Criador prometeu cumprir sem falta; então, ele se
pôs de joelhos, beijou-lhe a mão, e logo pediu:
— Senhor, tire-me um de meus olhos!
O Pai Eterno, espantado com o pedido, lhe diz:
— Jesus! E por quê?
E o homem tornou a dizer:
— Porque, conforme a sua promessa se me tirarem um
olho, hão de tirar os dois olhos dele; e assim, vendo este dano, eu me contento
e serei amigo do meu vizinho.
Pois é, a inveja é o diabo! ®Sérgio.
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Nota Sobre o
Texto: Este conto foi inspirado em um “caso” que circulava na tradição popular
lusitana.
Realmente... A inveja é coisa do diabo mesmo. É um bichinho que corrói a alma sem dó nem piedade.
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