domingo, 31 de janeiro de 2010

O TEATRO DE GIL VICENTE

O teatro vicentino tem como característica principal a sátira. Por meio dela Gil Vicente criticou todas as camadas sociais: a nobreza, o clero e o povo. Apesar de sua extrema religiosidade o alvo das sátiras de Gil era o frade que se entregava enlouquecidamente aos amores proibidos, a venda de indulgências, ao misticismo, ao mundanismo, à depravação dos costumes.
Gil não fez exceção na hierarquia clerical; criticou desde o frade de aldeia até o papa. No âmbito dos fiéis, criticou aqueles que rezavam mecanicamente; os que solicitavam, a Deus, favores pessoais e os que assistiam às missas por obrigação social:
Sapateiro: Quantas missas eu ouvi, / nom me hão elas de prestar?
Diabo: Ouvir missa, então roubar – / é caminho para aqui.
(diálogo entre um sapateiro e o Diabo; enxerto do Auto da Barca do Inferno)
Digno de observação é que, no teatro de Gil Vicente, o diabo nunca força ninguém ao pecado. As próprias pessoas o cometem por si só. Por exemplo: na peça Auto da Feira, o Diabo, do mesmo modo que um camelô, monta sua banca para oferecer os pecados, quando é interpelado por um anjo e assim argumenta o Diabo:
[...]
Mas cada um veja o que faz,
porque eu não forço ninguém.
Se me vem comprar
qualquer clérigo, ou leigo, ou frade
falsas manhas de viver,
muito por sua vontade,
senhor, que lhe hei-de-fazer?
Outra classe social muito criticada por Gil foi a baixa nobreza, representada pelo fidalgo decadente. Por outro lado, ele tinha especial carinho pelo "lavrador", que considerava o "verdadeiro povo", vítima da exploração de toda a estrutura social.
Sempre é morto quem do arado
há-de viver.
Nos somos a vida das gentes,
E morte de nossas;
A tiranos – pacientes
Que a unhas e a dentes
nos tem as almas roídas.
[...] (excerto do Auto da Barca do Purgatório)
Dos outros tipos humanos que povoaram os textos de Gil Vicente temos: O judeu ganancioso; a velha beata, o médico incompetente, a mulher adultera, o padre corrupto, o sapateiro que rouba o povo, a alcoviteira, o velho apaixonado que se deixa roubar. Gil Vicente não tem a preocupação de fixar tipos psicológicos, e sim sociais. A maior parte dos personagens de seu teatro não tem nome de batismo, sendo designados pela profissão ou pelo tipo humano que representam.
Quanto a forma (cenários e montagens) o teatro de Gil é extremamente simples. O texto apresenta estrutura poética, com predomínio da redondilha maior, havendo varias cantigas no corpo de sua peça.
A produção completa de Gil Vicente constitui-se de 44 peças, sendo 17 escritas em português, 11 em castelhano e 16 bilíngues.
A quem interessar, você pode baixar neste link o Auto da Barca do Inferno. ®Sérgio.
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Os excertos foram extraídos de: Vicente, Gil. Teatro de Gil Vicente. 5ª Ed. Lisboa, Portugália.
Algumas informações foram extraídas e adaptadas ao texto de: Nicola, José, Literatura. São Paulo, Scipione, 1998.

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