quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

JUSTIÇA SEJA FEITA - Recontando Contos Populares

Seu Antenor, mineirinho da gema, pensou melhor e decidiu que os ferimentos sofridos no acidente de trânsito há três semanas eram sérios o suficiente para levar o dono do outro carro ao tribunal.
No tribunal, o advogado do réu começou a inquirir seu Antenor:
— Não foi o Senhor que disse na hora do acidente: "Estou muito bem"?
E seu Antenor:
— Bão, vou lhe contá o que aconteceu. Eu tinha acabado di colocá minha mula favorita na caminhonete...
— Eu não pedi detalhes! - interrompeu o advogado. Só responda à pergunta! O senhor não disse na cena do acidente: "Estou muito bem"?
— Bão, eu coloquei a mula na caminhonete e tava deceno a rodovia...
O advogado interrompe novamente:
— Meritíssimo, estou tentando estabelecer os fatos aqui. Na cena do acidente este homem disse ao patrulheiro rodoviário que estava bem. Agora, várias semanas após o acidente ele está tentando processar meu cliente, e isso é uma fraude. Por favor, poderia dizer a ele que simplesmente responda à pergunta?
Mas, a essa altura, o Juiz estava muito interessado na resposta de seu Antenor e disse ao advogado:
— Eu gostaria de ouvir o que ele tem a dizer.
Seu Antenor agradeceu ao Juiz e prosseguiu:
— Como eu tava dizendo, coloquei a mula na caminhonete e tava descendo a rodovia quando uma picapi atravessô o sinar vermeio e bateu na minha caminhonete bem na laterar. Eu fui jogado fora do carro prum lado da rodovia e a mula foi jogada pro ôtro lado. Eu tava muito firido e num podia mi movê. De quarqué forma, eu pudia orvi a mula zurrano e grunhino e, pelo baruio, eu pude percebê que o estado dela era muito ruim.
E continuou:
— Logo dispois do acidente, o patruiero rodoviário chegô no locar. Ele orviu a mula gritano e zurrano e foi até onde ela tava. Depois de dá uma oiada nela, ele pegô a arma e atirô bem nos óio do animar. Então, o policiar atravessô a estrada com sua arma na mão, oiô pra mim e disse:
— Sua mula estava muito mal e eu tive que atirar nela. Como o senhor está se sentindo?
E olhando para o Juiz, o Seu Antenor perguntou:
— E o sinhô, o quê que falaria meritisso?!
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História retirada e adaptada de Ponte Preta, Stanislaw. Choro, Vela e Cachaça. In: Garoto Linha Dura. 4ª ed. Rio de Janeiro, Ed. Civilização Brasileira, 1975. p. 154-55.

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