Sempre que assisto a um bom filme,
procuro trocar ideias com amigos e conhecidos a respeito do enredo do filme. O
Gladiador, além de arrematar cinco Oscar(es), levou ao cinema, no mundo todo,
um grande público. Aqui não foi diferente.
Para a maioria das pessoas com quem
tive a oportunidade de conversar, ficou uma indagação: o que era ficção e o que
era História. Isso é, exatamente, o que Hollywood não quer dizer. Se disser o
entretenimento acaba. Envolvido, também, por esse questionamento, fui
pesquisar; e descobri que:
• Se você
achou que os gladiadores eram mesmo, como aqueles heróis do filme, altos e
musculosos, é melhor ficar com Hollywood. Na realidade, a maioria dos
gladiadores tinha menos de 1,70m, gordura sobrando e, frequentemente, eram
executados nos fundos da arena, com golpes de martelo na cabeça.
•
Máximo,
o Gladiador, protagonista do filme, é pura ficção. Foi inventado.
•
Do filme Spartacus (1960) foram emprestados três personagens fictícios:
a) Draba, o negro
africano que se torna amigo de Spartacus; foi Juba em Gladiador. Também, se
torna amigo de Máximo.
b) Batiato senhor de
Spartacus; um governante de bom coração. Rebatizado de Próximo, em Gladiador,
senhor de Máximo.
c) O cínico Senador
Graco que enxerga Roma como ela realmente é: bela e corrupta; foi totalmente
emprestado de Spartacus, até seu nome foi mantido.
•
Spartacus realmente existiu, e foi executado pelos romanos em 71 a.C.
• A ideia para ascensão de Cômodo, filho
do Imperador, veio do filme Calígula (1980). Demente e apaixonado por sua irmã
Drusila (como Cômodo era por sua irmã), Calígula mata o tio (no Gladiador,
Cômodo o pai) para se tornar Imperador.
• César Marco Aurélio Antonino Augusto -
Marco Aurélio para os íntimos, que eram bem poucos - pai de Cômodo, foi,
realmente, Imperador Romano durante 19 anos. Além de estar presente nas
batalhas, ele achava tempo para escrever sobre filosofia - no que foi bem
sucedido, uma de suas obras, Meditações, resistiu ao tempo e chegou ate nós.
Marco Aurélio morreu em 180 a.C., vitimado por uma daquelas pestes que eram
comuns há 2.000 anos. A epidemia foi propagada pelos próprios soldados do
imperador, no regresso de uma campanha militar («higiene» não era exatamente
uma das prioridades dos soldados).
• Cômodo, na realidade, não assassinou o
pai, como na ficção. Por que o faria, se aos cinco anos já tinha recebido o
título de César, o que equivalia a uma pré-nomeação para governar o Império
Romano. Aos 17 anos foi empossado co-imperador e reinou em conjunto com o pai,
Marco Aurélio, durante três anos. Com a morte do pai assumiu o poder e pelos 12
anos seguintes (bem mais que no filme), mandou e desmandou em Roma. Foi um
melomaníaco. Tentou mudar o nome de Roma para Comodônia e, substituir os nomes
dos meses do ano, pelos seus próprios (ele se chamava César Marco Aurélio
Cômodo Antonino Augusto) e pelos títulos honoríficos que recebia do Senado
Romano, como Invicto, Félix e Pio. Cômodo, também era um pervertido sexual
(hobby de muitos imperadores romanos). Morreu em 192 a.C., estrangulado por um
dos seus protegidos, um atleta chamado Narciso Mérida. Aliás, no primeiro
rascunho do filme, o protagonista (Máximo) era chamado de Narciso. A preferência
por Máximo Décimo Merídio veio a calhar, quem iria torcer por um herói chamado
Narciso Mérida?
• O
que parecia mais improvável no filme é mesmo verdade: Cômodo fazia suas
estripulias na arena do Coliseu, matando feras e enfrentando gladiadores, embora
haja sérias dúvidas quanto à qualidade e a motivação dos oponentes que eram
escalados para medir forças com o imperador. As más línguas dizem que Cômodo
era filho ilegítimo. Havia o boato de que a rainha Faustina teve uma aventura
com um gladiador. Esse detalhe, omitido no filme, talvez explicasse a
fascinação que os jogos de gladiadores exerciam sobre Cômodo.
• Lucila, a irmã mais velha de Cômodo,
realmente o detestava. No segundo ano de mandato do irmão armou uma conspiração
para assassiná-lo. Mas a Lucila real não teve a mesma sorte que a da ficção:
Cômodo a deportou para a ilha italiana de Capri, perto de Nápoles e, logo após,
ordenou sua execução.
• A reconstituição arquitetônica do
Coliseu, no filme é exemplar; alojava algo em torno de 50000 pessoas. A
carnificina não era somente diária, mas durava de sol a sol, isto é, a qualquer
dia, e a qualquer hora, quem fosse ao Coliseu veria algum espetáculo. Essa era
a teoria dos organizadores: enquanto o povo estivesse ocupado vendo combates
sangrentos não se preocuparia com outras coisas, como uma revolução (será por
isso que temos tantos e enormes estádios de futebol e poucos
hospitais?). Daí vem à famosa frase: pão e circo!
• O nome Coliseu, entretanto, só
aparecerá 1.000 anos depois da época do filme. Na época de Marco Aurélio e
Cômodo, o estádio era chamado de Anfiteatro Flaviano.
• SPQR
- a sigla tatuada que Máximo raspa do braço quando decide levar a sério a
carreira de Gladiador -, significa: "para o Senado e o Povo de Roma"
(Senatus Popules Que Romanus). Tinha a tatuagem porque pertencia a uma classe
inferior, a dos soldados. Gente fina não se tatuava no tempo dos Romanos, só a
ralé. É daí que surgiu uma expressão usada até hoje, «ele carrega um estigma».
A palavra latina para tatuagem era estigma. ®Sérgio.
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